quarta-feira, 25 de junho de 2025

A Impossibilidade de um Universo Relacional nas Mãos do Acaso

 “A evolução não se sustenta por força das complexidades da natureza. As complexidades exigem relacionamento obrigatório, fato que o acaso não pode sustentar.”


📘 Ensaio Teológico-Filosófico

A Impossibilidade de um Universo Relacional nas Mãos do Acaso

Introdução

A proposta evolucionista naturalista — que defende a origem e complexificação da vida a partir de forças cegas, aleatórias e não dirigidas — tem enfrentado crescente contestação não apenas no campo teológico, mas também filosófico. A razão está em um ponto fundamental: a complexidade integrada da criação não apenas desafia o acaso, mas o torna logicamente insuficiente. Mais ainda, os múltiplos níveis de relacionamento obrigatório encontrados na natureza revelam que a existência não pode ser sustentada fora de uma mente intencional, ordenadora e pessoal.

Thomas Nagel (2012), filósofo ateu e professor da Universidade de Nova York, argumenta que a consciência, a razão e os valores objetivos não podem ser adequadamente explicados por mecanismos puramente físico-químicos. Em Mind and Cosmos, ele sustenta que o materialismo neodarwinista fracassa em dar conta da mente, sendo "quase certamente falso". Para Nagel, qualquer teoria abrangente da realidade deve incluir elementos teleológicos ou não redutíveis à matéria.

A posição de Thomas Nagel apresenta uma tensão filosófica significativa. Por um lado, ele denuncia a insuficiência do naturalismo materialista ao afirmar que a mente, a consciência e os valores morais não podem ser reduzidos a processos físico-químicos. Por outro, ele expressa resistência explícita à ideia de um Deus pessoal como causa final dessas realidades.

Em Mind and Cosmos, Nagel escreve: “Desejo que o ateísmo seja verdadeiro e fico incomodado com o fato de algumas das pessoas mais inteligentes que conheço serem crentes.” (NAGEL, 1997, p. 130)

Essa declaração, feita em obra anterior (The Last Word), revela que sua crítica ao naturalismo não parte de uma abertura religiosa, mas de um reconhecimento intelectual da falência do paradigma vigente. Assim, Nagel propõe que a estrutura do universo pode conter princípios internos, não-redutíveis, que conduzem ao surgimento da vida e da mente — uma forma de teleologia impessoal.

Embora ele rejeite a ideia de um Criador inteligente, sua insistência em que qualquer teoria abrangente da realidade deve considerar a mente como “uma característica fundamental do mundo” (NAGEL, 2012, p. 16) aproxima seu pensamento de perspectivas que reconhecem o design, ainda que ele recuse o designador.

Dessa forma, Nagel ocupa uma posição singular no debate atual: é um crítico interno ao sistema naturalista, mas que se detém no limiar do teísmo. Sua obra tem servido como uma “ponte filosófica” para que muitos acadêmicos, ainda não teístas, reavaliem os pressupostos do materialismo. Ele não oferece uma explicação completa, mas rompe com o dogma reducionista e reabre espaço para uma ontologia mais rica — o que, inevitavelmente, aproxima sua crítica das abordagens que defendem o papel de uma inteligência ordenadora.

Alvin Plantinga (2011), por sua vez, apresenta o “argumento evolutivo contra o naturalismo”, segundo o qual, se nossas faculdades cognitivas são produto de um processo aleatório e sem propósito, então não há razão para confiarmos na veracidade das crenças que essas faculdades produzem — incluindo a própria crença no naturalismo. Assim, o naturalismo mina a si mesmo epistemologicamente.

Alvin Plantinga propõe que o naturalismo — quando combinado com a teoria da evolução — se autodestrói epistemologicamente. Em sua obra Where the Conflict Really Lies (2011), ele formula o chamado Argumento Evolutivo contra o Naturalismo (AEN), que pode ser resumido da seguinte forma:

Se as faculdades cognitivas humanas são produto exclusivo de processos evolutivos aleatórios e não direcionados (isto é, mutações e seleção natural), então a probabilidade de que essas faculdades produzam crenças verdadeiras não é alta — na verdade, é incognoscível ou baixa. A seleção natural se preocupa com comportamentos adaptativos, não com a verdade das crenças que os sustentam.

Segundo Plantinga, um organismo pode sobreviver e se reproduzir mesmo acreditando em ideias completamente falsas, desde que seu comportamento prático o mantenha vivo. Por exemplo, se um ser humano acredita que beber água o mata (crença falsa), mas por algum motivo sempre evita água e sobrevive bebendo outro líquido (por superstição ou engano), ele pode sobreviver, ainda que pense de forma incorreta. Isso mostra que crenças falsas podem ser compatíveis com comportamentos adaptativos.

Se isso for verdade, então não há base confiável para supor que nossas crenças sejam geralmente verdadeiras — incluindo a própria crença no naturalismo e na evolução. Ou seja, o naturalismo, ao afirmar que nossa mente é produto de forças cegas e não intencionais, torna implausível confiar na racionalidade das nossas próprias crenças, o que o torna autorrefutável.

Alvin Plantinga propõe que a combinação entre naturalismo (a ideia de que não existe nada além da natureza física) e evolução darwinista (que opera por mutações aleatórias e seleção natural) conduz a uma forma de autorrefutação epistemológica. Para isso, ele estrutura um argumento formal que pode ser expandido da seguinte maneira:

Premissas ampliadas:

P1. O naturalismo é verdadeiro. Ou seja, tudo o que existe é físico e impessoal; não há mente divina, nem propósito transcendente.

P2. A teoria evolutiva (neodarwinista) é verdadeira. Isso implica que as faculdades cognitivas humanas surgiram por meio de mutações aleatórias e seleção natural, sem direcionamento ou intenção de produzir verdade.

P3. A seleção natural favorece comportamentos que aumentam a sobrevivência, não necessariamente a formação de crenças verdadeiras. Crenças falsas podem, em muitos casos, gerar comportamentos adaptativos. Logo, o processo evolutivo não tem como objetivo produzir mentes confiáveis, mas apenas organismos eficientes para reprodução.

P4. Se nossas faculdades cognitivas foram moldadas por um processo cego e não orientado à verdade, então a probabilidade de que elas sejam confiáveis é baixa ou incerta. Plantinga chama essa probabilidade de Pr(CR | N&E) — isto é, a probabilidade de que nossas faculdades cognitivas sejam Confiáveis (CR), dado o Naturalismo (N) e a Evolução (E).

P5. Se não podemos confiar na confiabilidade de nossas faculdades cognitivas, então não temos base para confiar em nenhuma crença produzida por elas, inclusive as crenças no naturalismo e na evolução.

Portanto, se o naturalismo e a evolução são ambos verdadeiros, então não temos boas razões para crer que o naturalismo e a evolução sejam verdadeiros.
Em termos lógicos: O naturalismo, quando combinado com a evolução, mina sua própria credibilidade.

O argumento de Plantinga não nega a evolução em si, nem rejeita a ciência. O que ele faz é mostrar que sem uma mente racional por trás do universo, não há garantia de que nossas mentes sejam instrumentos confiáveis de busca pela verdade.

O teísmo, ao contrário, fornece uma justificativa ontológica para a confiabilidade das faculdades cognitivas: elas foram criadas por um Deus racional e voltado para a verdade.

Portanto, a única forma de sustentar uma confiança racional em nossas crenças é rejeitar o naturalismo ou rejeitar a exclusividade da seleção natural como causa de nossas faculdades cognitivas.

Esse argumento não se propõe a refutar a evolução em si, mas a mostrar que, sem uma mente racional por trás da criação do ser humano, o próprio ato de confiar na razão humana fica sem fundamento. Ele afirma que o teísmo, por outro lado, oferece uma base coerente para a confiança racional: Deus criou seres com faculdades cognitivas voltadas à verdade.

David Berlinski (2009), matemático e autor agnóstico, critica a pretensão do darwinismo de explicar a totalidade da realidade biológica. Ele argumenta que a teoria falha em oferecer demonstrações matemáticas satisfatórias sobre como estruturas complexas poderiam surgir gradualmente. Para Berlinski, muito do que se apresenta como ciência é, na verdade, uma filosofia embutida, que carece de verificabilidade rigorosa.

Berlinski tem se destacado como um dos mais críticos comentaristas da ciência moderna, em especial do que ele chama de “pretensões filosóficas travestidas de ciência”. Em sua obra The Devil’s Delusion: Atheism and Its Scientific Pretensions (2009), Berlinski argumenta que muitos aspectos da biologia evolucionista não se sustentam como ciência empírica, mas se apresentam como uma cosmovisão filosófica, envolta em uma linguagem científica que mascara sua falta de verificabilidade experimental.

Segundo Berlinski, o darwinismo — especialmente em sua versão naturalista e neodarwinista — é frequentemente promovido como um sistema explicativo fechado e completo, embora careça de modelos matemáticos rigorosos, previsibilidade, e falsificabilidade clara, critérios fundamentais para a demarcação científica tradicional. Ele afirma que a biologia evolucionista lida majoritariamente com narrativas históricas retroativas (como reconstruções adaptativas) que não podem ser testadas ou replicadas, o que as torna mais próximas de especulação filosófica do que de ciência empírica robusta.

Berlinski é incisivo ao declarar: “A teoria da evolução é a grande ficção da biologia moderna — não por causa de sua falsidade, mas por causa de sua ambição filosófica disfarçada de objetividade científica.” (BERLINSKI, 2009, tradução livre)

Ele aponta que, quando pressionados a apresentar modelos computacionais ou matemáticos que demonstrem como a seleção natural e as mutações aleatórias poderiam gerar estruturas complexas (como o olho, o flagelo bacteriano, ou sistemas de regulação genética), os proponentes da teoria frequentemente recorrem a metáforas ou analogias, mas não a demonstrações formais. Em vez de ciência operacional, o que se observa, segundo Berlinski, é uma narrativa ideológica, sustentada muitas vezes por convicções materialistas e ateias, e não por dados incontroversos.

A crítica central de David Berlinski ao pensamento científico contemporâneo se dirige ao que ele denomina de cientificismo — a crença de que somente a ciência empírica pode gerar conhecimento verdadeiro, confiável e relevante, e que toda explicação válida sobre o universo deve necessariamente se basear em causas naturais, mensuráveis e quantificáveis.

Contudo, como Berlinski argumenta, essa afirmação não é científica, mas sim filosófica, e por isso mesmo não pode ser verificada pela própria ciência. Trata-se de um pressuposto metafísico travestido de conclusão científica.

Estrutura lógica da crítica:

  1. Toda ciência depende de pressupostos não científicos. A ciência, enquanto método, parte de fundamentos que ela mesma não pode provar: por exemplo, a existência de uma realidade externa, a confiabilidade da razão humana, a regularidade das leis naturais e a validade da inferência lógica. Esses pressupostos são filosóficos e ontológicos, não empíricos.
  2. O cientificismo afirma que apenas a ciência é fonte de verdade. Isso implica que qualquer outra forma de conhecimento — filosofia, teologia, estética, ética — seria secundária, irrelevante ou ilusória. A única “verdade” seria aquela obtida por experimentação, mensuração e modelagem matemática.
  3. Mas essa crença não é científica. A afirmação “somente a ciência fornece conhecimento verdadeiro” não pode ser demonstrada cientificamente. Não há experimento que a comprove, nem dados que a sustentem. Ou seja, há um experimento observável, testável e repetível que comprove que apenas o método científico pode gerar verdades confiáveis? A resposta é não, porque essa afirmação não é produto de experimentação, nem é verificável por observação. Ela não é uma conclusão científica, mas sim um pressuposto filosófico sobre a ciência. A contradição ocorre porque: Ela exige que todas as crenças válidas sejam cientificamente verificáveis; mas ela mesma não pode ser verificada cientificamente, logo, ela se exclui do próprio critério que impõe.

Essa é a definição de uma afirmação autocontraditória ou performativamente incoerente: ela falha nas próprias condições que exige para ser aceita como válida.  Logo, ela não se justifica pelos próprios critérios que impõe — e por isso é autocontraditória. Então, o cientificismo é uma posição filosófica disfarçada de método científico. Ao reivindicar exclusividade epistemológica, o cientificismo se torna um dogma, não uma conclusão. E o problema maior, segundo Berlinski, é que esse dogma domina a academia contemporânea sem ser reconhecido ou debatido como filosofia — ele opera como uma ortodoxia epistemológica silenciosa.

Exemplo da falácia performativa:

Afirmar que “apenas afirmações cientificamente verificáveis são válidas” não é uma afirmação cientificamente verificável. Portanto, ela se refuta a si mesma. Essa é uma falácia performativa: o ato de enunciar a tese contradiz sua própria premissa.

Implicação da crítica:

Ao mostrar que o cientificismo é uma filosofia não assumida, Berlinski desmonta a pretensão de neutralidade da ciência moderna. Ele não nega o valor da ciência como método, mas denuncia a elevação da ciência a autoridade totalizadora, o que configura uma postura ideológica. Sua crítica, portanto, não é contra a ciência, mas contra a absolutização da ciência como única via legítima de acesso à realidade.

Exemplo clássico de falácia performativa: “Nenhuma frase com mais de cinco palavras é verdadeira.” Essa frase tem mais de cinco palavras — e, portanto, viola a si mesma. O cientificismo comete o mesmo erro: “Somente afirmações verificáveis cientificamente são válidas”. Mas essa afirmação não é verificável cientificamente. Logo, ela se autorefuta.

O cientificismo se apresenta como um princípio neutro e racional, mas na verdade é uma crença metafísica e exclusiva que não pode ser testada por seus próprios padrões. Como David Berlinski, Alvin Plantinga e C. S. Lewis apontam, a ciência é uma ferramenta poderosa para descobrir verdades sobre o mundo físico, mas ela não é capaz de justificar sua própria autoridade epistemológica — isso é papel da filosofia.

No campo da biologia molecular, diversas críticas têm surgido quanto à capacidade do darwinismo explicar sistemas altamente complexos. Michael Behe (1996) cunhou o conceito de "complexidade irredutível" para descrever sistemas biológicos que não funcionam se qualquer uma de suas partes for removida. Para ele, tais sistemas não poderiam ter surgido por etapas sucessivas.

Stephen C. Meyer (2009; 2013) argumenta que a informação presente no DNA se assemelha a códigos linguísticos e exige uma explicação causal inteligente. Em seus trabalhos, ele propõe que o design inteligente é uma inferência científica legítima para a origem da informação biológica. É uma tentativa de reposicionar o Design Inteligente (DI) não como um argumento teológico disfarçado, mas como uma inferência científica legítima, baseada nos mesmos critérios utilizados em outras áreas da ciência.

Stephen C. Meyer, em suas obras Signature in the Cell (2009) e Darwin’s Doubt (2013), desenvolve uma tese central: a de que a origem da informação funcional complexa presente no DNA e nos sistemas bioquímicos vivos não pode ser explicada adequadamente por mecanismos naturalistas como mutações aleatórias e seleção natural.

O DNA, argumenta Meyer, contém sequências de nucleotídeos que funcionam como códigos digitais — instruções precisas para a construção de proteínas. Esse padrão de codificação apresenta o que ele chama de informação funcional complexa e especificada (specified complex information), que é estatisticamente altamente improvável de surgir por acaso. A partir disso, Meyer propõe que o melhor modelo causal para esse tipo de informação é o design — não porque ele rejeita a ciência, mas porque aplica um tipo de inferência científica comum em outras áreas, como arqueologia, investigação forense e busca por inteligência extraterrestre (como no projeto SETI, Search for Extraterrestrial Intelligence – Busca por Inteligência Extraterrestre).

Ele baseia sua defesa do DI no que chama de inferência à melhor explicação (inference to the best explanation), um método reconhecido na filosofia da ciência. Esse método consiste em: Observar um efeito presente (neste caso, a informação complexa e funcional no DNA); considerar várias causas possíveis que, em princípio, poderiam produzi-lo; escolher como mais provável a causa que, com base na experiência e na lógica, possui maior poder explicativo.

Segundo Meyer, em toda a nossa experiência, sistemas de informação funcional só são produzidos por agentes inteligentes. Por isso, ele conclui que o design inteligente é a melhor explicação disponível para a origem da informação biológica, ainda que essa conclusão tenha implicações que vão além da metodologia naturalista tradicional.

Importa destacar que, para Meyer, essa inferência não depende de ignorância ("não sabemos, logo foi design"), mas sim do que ele chama de conhecimento uniforme e repetitivo da causa necessária para esse tipo de efeito — ou seja, daquilo que sabemos sobre como informação é gerada em qualquer outro contexto.

 Quadro Comparativo: Origem da Informação Biológica – Naturalismo vs. Design Inteligente.

Critério de Análise

Explicação Naturalista

Explicação por Design Inteligente

Natureza da informação no DNA

Produto de processos físico-químicos aleatórios e não dirigidos

Produto de codificação intencional por uma mente inteligente

Mecanismo proposto

Mutações aleatórias + seleção natural

Causa inteligente com capacidade de gerar informação funcional

Objetivo declarado

Nenhum – os processos são cegos e não orientados

Intencionalidade – geração de sistemas complexos funcionais

Analogias utilizadas

Jogo de dados, seleção cumulativa, algoritmos genéticos

Código de computador, linguagem, programação

Fonte da informação funcional

Acaso estatístico e pressão ambiental

Inteligência como causa conhecida e necessária

Evidência empírica alegada

Microevolução observável, simulações computacionais

Uniformidade da experiência: só mentes produzem códigos

Critérios metodológicos usados

Naturalismo metodológico

Inferência à melhor explicação (como em arqueologia ou SETI)

Verificabilidade/falsificabilidade

Em muitos casos, especulativa ou indireta (ex: origem da vida)

Falsificável: se for demonstrado que processos naturais geram informação complexa de forma espontânea

Aceitação na academia

Ampla, por ser compatível com o paradigma naturalista dominante

Controversa, frequentemente rejeitada por razões filosóficas

Implicações filosóficas

Materialismo, ausência de propósito no universo

Teleologia, existência de racionalidade fora da matéria

A teoria do Design Inteligente não depende da identificação do agente causador, mas da presença de padrões de informação que, em qualquer outro contexto, indicariam mente. A mesma metodologia usada em campos como SETI, arqueologia ou criptografia é aplicada aqui.

Douglas Axe, PhD em engenharia genética pela Caltech e pesquisador em biologia molecular, contribuiu significativamente para o debate sobre a origem da complexidade biológica com seus experimentos sobre a funcionalidade das proteínas. Em seu livro Undeniable: How Biology Confirms Our Intuition That Life Is Designed (2016) e em publicações anteriores (Journal of Molecular Biology, 2004), Axe apresenta evidências experimentais de que a proporção de sequências de aminoácidos que resultam em proteínas funcionais é extremamente pequena dentro do universo de possibilidades combinatórias.

Axe investigou quantas sequências possíveis de aminoácidos em uma cadeia proteica gerariam uma estrutura dobrada funcional, capaz de desempenhar uma atividade bioquímica específica. Utilizando técnicas de mutagênese e expressão proteica, ele demonstrou que a maioria esmagadora das combinações possíveis resulta em proteínas disfuncionais.

Em termos quantitativos, ele estimou que apenas 1 em 10⁷⁴ sequências possíveis de uma proteína média (com cerca de 150 aminoácidos) resulta em uma estrutura funcional estável.

Esse número é astronomicamente pequeno, o que sugere que a busca aleatória por proteínas funcionais no “espaço de sequências” é estatisticamente impraticável, mesmo considerando os tempos geológicos propostos pela biologia evolutiva. Ou seja, o acaso cego combinado à seleção natural não possui poder suficiente para gerar as proteínas básicas necessárias à vida — muito menos os sistemas complexos interativos nos quais essas proteínas operam.

A implicação do trabalho de Axe é direta: a explicação neodarwinista de que mutações aleatórias selecionadas por vantagem adaptativa podem construir progressivamente a complexidade funcional da vida não é sustentada por evidência probabilística viável. Mesmo assumindo que mutações úteis seriam selecionadas, a chance de elas ocorrerem em primeiro lugar é desprezível.

Esse resultado corrobora o argumento do Design Inteligente, pois, segundo Axe, a presença de informação funcional em estruturas altamente específicas é, em todos os contextos conhecidos, o produto de inteligência — nunca de processos não guiados.

Além dos dados experimentais, Axe argumenta que a própria intuição humana cotidiana reconhece que funcionalidade e organização complexa são sinais de projeto. Assim, o reconhecimento de design na biologia não é apenas cientificamente justificável, mas também intuitivamente evidente.

O filósofo britânico Roger Scruton (1944–2020), um dos pensadores conservadores mais respeitados das últimas décadas, dirigiu críticas contundentes ao reducionismo científico e à tendência moderna de considerar apenas o que é quantificável, mensurável e físico como verdadeiramente real. Em The Soul of the World (2014), ele argumenta que essa visão empobrece o ser humano, desconsiderando precisamente aquilo que nos torna humanos: a arte, o amor, a moralidade, a consciência e a experiência do sagrado.

Para Scruton, o reducionismo científico, ao tentar explicar todos os aspectos da realidade a partir de processos físicos elementares, oblitera os níveis superiores de significado, como se fossem ilusões emergentes ou epifenômenos irrelevantes. No entanto, ele sustenta que a verdade sobre o ser humano não está nos átomos que o compõem, mas na pessoa que se revela — na face, na voz, na linguagem, nos gestos intencionais, na cultura e na relação interpessoal.

Scruton propõe uma visão de realidade estratificada, onde diferentes níveis de existência requerem diferentes modos de explicação. O erro do cientificismo está em tentar reduzir o todo ao que é apenas uma de suas partes — como explicar a música apenas por frequências, ou o amor apenas por neurotransmissores.

Ele escreve: “As ciências naturais explicam o mundo em termos de causas e efeitos. Mas nós, como sujeitos, habitamos um mundo de significados, intenções e valores — um mundo que não pode ser explicado por leis físicas.” (SCRUTON, The Soul of the World, 2014, p. 4)

Scruton afirma que fenômenos como o amor pessoal, a obrigação moral e a beleza artística não são redutíveis a nenhuma descrição biológica ou química. Essas experiências são vividas como fins em si mesmas, e não como meios adaptativos para a sobrevivência. Portanto, são testemunhos ontológicos de que há algo mais na realidade do que matéria em movimento.

Na estética, Scruton é igualmente enfático: a beleza não é apenas um resultado de estruturas neurais ou de preferências evolutivas, mas aponta para uma ordem mais alta, que comunica sentido e dignidade à existência. A experiência da beleza, sobretudo na música e na arquitetura sacra, sugere uma dimensão vertical da realidade — uma elevação da alma que não pode ser traduzida em equações.

A crítica de Scruton resgata o papel da filosofia, da teologia e da arte como modos legítimos de conhecimento, que não se subordinam ao método empírico, mas que nos dizem algo verdadeiro sobre a realidade. Assim, ele se posiciona contra a monocultura epistêmica do materialismo, defendendo que só uma visão ampliada e integrada do ser humano pode responder às questões últimas sobre significado, valor e finalidade.

 Tabela Comparativa: Abordagem Científica vs. Abordagem Fenomenológica segundo Roger Scruton

Dimensão

Ciência Reducionista (Naturalismo)

Fenomenologia segundo Scruton

Objeto de estudo

Partículas, forças, sistemas materiais

Pessoa, consciência, linguagem, arte, amor

Método

Análise causal, quantificação, decomposição

Compreensão do significado, experiência vivida, intuição cultural

Linguagem

Técnica, matemática, descritiva

Pessoal, simbólica, interpretativa

Tipo de verdade buscada

Explicações funcionais e mecânicas (como funciona)

Compreensão de sentido e valor (por que importa)

Natureza da realidade humana

Organismo biológico complexo

Sujeito pessoal dotado de liberdade, dignidade e interioridade

Amor e moralidade

Produtos de evolução e neuroquímica

Realidades superiores, intencionais e não-redutíveis

Arte e música

Resultados de preferências evolucionárias ou estímulos neurais

Experiências estéticas profundas que revelam o transcendente

Religião e sacralidade

Ilusões úteis ou construções culturais adaptativas

Dimensões reveladoras do sentido último da existência

Exemplo de explicação

"A beleza da música ativa áreas do cérebro ligadas à recompensa"

"A música é um meio de elevação da alma em direção ao invisível"

Limites reconhecidos

Tudo deve ser explicado por leis naturais

Nem tudo pode ser reduzido sem perda do essencial

Scruton não nega o valor da ciência, mas alerta que explicar não é o mesmo que compreender. Para ele, os fenômenos humanos mais profundos — como o amor, a arte e o sagrado — só podem ser entendidos quando vistos de dentro, como experiências carregadas de significado, e não como reações bioquímicas.

John Lennox, professor emérito de Matemática na Universidade de Oxford e autor de God’s Undertaker: Has Science Buried God? (2007), propõe que a própria existência da ciência depende de pressupostos filosóficos que apontam para a existência de Deus, e não para o seu abandono. Contra a tese do chamado "conflito entre ciência e fé", Lennox argumenta que a investigação científica só é possível porque o universo é ordenado, inteligível e racionalmente acessível — características que fazem mais sentido dentro de uma cosmovisão teísta do que numa naturalista.

Lennox destaca que, para que a ciência exista como prática, é necessário pressupor: que o universo segue leis constantes e universais; que o ser humano possui faculdades cognitivas confiáveis para decifrar essas leis; que existe uma correspondência entre a razão humana e a estrutura racional do cosmos.

Essas três premissas, longe de serem explicadas pelo naturalismo ateísta, são assumidas por ele sem justificativa. Lennox afirma que tais pressupostos são mais coerentemente fundamentados em um Criador racional, que fez o ser humano à Sua imagem e estruturou o universo de forma inteligível.

Como ele mesmo expressa: “A racionalidade da mente humana e a inteligibilidade da natureza são duas faces da mesma moeda — e ambas fazem sentido apenas se forem obra da mesma mente”(LENNOX, 2007).

Além disso, Lennox observa que a ciência moderna surgiu no berço da civilização cristã, e não apesar dela. Cientistas como Newton, Kepler, Boyle e Faraday acreditavam que estavam pensando os pensamentos de Deus depois d’Ele, justamente porque concebiam o universo como produto de um Criador racional. O surgimento da ciência, portanto, foi motivado pela crença de que o mundo tinha ordem porque havia sido feito por um Deus de ordem. “A ciência não enterra a fé — ela nasceu da fé” (LENNOX, 2007)

Lennox também desafia o naturalismo ao apontar que, se nossas mentes são apenas o subproduto de processos aleatórios e não dirigidos, não há razão para confiar na validade das nossas conclusões científicas. Isso o aproxima da crítica epistemológica de Alvin Plantinga (com quem Lennox dialoga), segundo a qual o naturalismo é epistemicamente autodestrutivo. “O fato de podermos fazer ciência é evidência de que nossas mentes foram feitas para entender um universo que foi feito para ser compreendido” (LENNOX, God’s Undertaker, 2007).

Objeções comuns e respostas ao argumento contra o acaso como fonte de complexidade funcional.

Objeção 1: “O acaso não atua sozinho, mas é guiado pela seleção natural”

Contra-argumento:

De fato, a teoria neodarwinista não afirma que o acaso atua sozinho; ela combina mutações aleatórias com seleção natural não-direcionada. Contudo, esse modelo só é eficaz após o surgimento de uma função minimamente estável que possa ser selecionada.

A origem dessa funcionalidade inicial continua inexplicada. Como destaca Stephen Meyer (2009), a seleção natural é um filtro, não um criador. Ela não opera sobre o caos, mas apenas sobre o que já funciona. Se a primeira proteína funcional é estatisticamente improvável de surgir por acaso (Axe, 2004), o problema de origem permanece insolúvel dentro do modelo neodarwinista.

Objeção 2: “A ordem pode emergir espontaneamente em sistemas complexos, como nos cristais ou redemoinhos”

Contra-argumento:

Cristais, redemoinhos e padrões de convecção (como as células de Bénard) são, de fato, estruturas ordenadas auto-organizadas. Contudo, elas não carregam informação funcional, nem desempenham tarefas complexas codificadas por um sistema simbólico, como ocorre no DNA.

Esses fenômenos físicos seguem leis determinísticas e não produzem sistemas com múltiplas partes interdependentes, com função específica e baseada em instruções codificadas. A estrutura de um ribossomo ou de uma enzima funcional é qualitativamente diferente da simetria de um floco de neve.

Objeção 3: “Probabilidades extremamente baixas ainda são possíveis em escalas cosmológicas de tempo e espaço”

Contra-argumento:

Embora eventos altamente improváveis possam, em tese, ocorrer em longos períodos, o problema não é apenas de tempo, mas de limitação combinatória e informação específica.

Douglas Axe (2004) demonstra que, mesmo assumindo todo o tempo disponível desde o início do universo, o número de tentativas possíveis (com base em eventos moleculares reais por segundo) é insuficiente para encontrar por acaso uma única proteína funcional entre 10⁷⁴ possibilidades. Isso é estatisticamente irrelevante, mesmo em escalas astronômicas.

Objeção 4: “A vida pode ter surgido por caminhos alternativos ainda desconhecidos”

Contra-argumento:

Essa é uma objeção de ignorância epistemológica. O fato de que não conhecemos ainda todos os possíveis mecanismos não valida a hipótese do acaso.

A crítica aqui não é ao desconhecimento atual, mas ao fato de que os dados que já temos (bioquímicos, informacionais e probabilísticos) refutam a suficiência do acaso como causa da informação funcional. Invocar caminhos desconhecidos é especulativo e carece de poder explicativo, caindo no que o próprio Meyer chama de “cientificismo esperançoso”.

Objeção 5: “A entropia permite ordem local em sistemas abertos, como a Terra”

Contra-argumento:

É verdade que a Segunda Lei da Termodinâmica permite redução local da entropia (ordem crescente) em sistemas abertos, desde que haja fluxo de energia e mecanismos de conversão funcional dessa energia em trabalho organizado.

O problema é que o fluxo de energia por si só não gera informação funcional, assim como jogar energia sobre um computador não escreve um software. Sem um sistema codificador, armazenador e interpretador de informação, a energia tende a aumentar o ruído, e não a ordem funcional.

A crítica à ideia de que o acaso pode gerar sistemas biologicamente complexos não nega a mutação, a adaptação ou a microevolução. O que ela contesta é a capacidade criativa atribuída indevidamente a um processo cego e não-intencional, em especial na origem da informação funcional primária — algo que, até hoje, nenhuma hipótese naturalista demonstrou produzir de forma empírica.

Em sua obra Miracles (1947), o escritor e filósofo britânico C. S. Lewis propõe um argumento profundo contra o naturalismo materialista: se tudo no universo — incluindo a mente humana — é produto de processos físicos inconscientes e irracionais, então a própria razão perde sua autoridade. Lewis afirma que a racionalidade humana, tal como a conhecemos, só pode existir se for derivada de uma fonte racional — isto é, de uma mente superior que seja a origem do logos (razão universal).

Lewis chama atenção para o fato de que, sob o naturalismo estrito, todas as crenças humanas são, em última instância, efeitos de causas não racionais — como impulsos neuroquímicos, respostas condicionadas, ou heranças evolucionárias. No entanto, isso gera um paradoxo: Se nossas crenças são fruto de causas irracionais, por que confiar que elas sejam verdadeiras?

Inclusive, a própria crença no naturalismo estaria nessa condição — e, portanto, não seria confiável.

Essa linha de raciocínio é semelhante àquela desenvolvida mais tarde por Alvin Plantinga com o “argumento evolutivo contra o naturalismo”, mas em Lewis ela aparece de forma antecipada e com mais ênfase existencial e metafísica. Lewis escreve: “A menos que a razão seja uma realidade absoluta — derivada de algo além da natureza — então toda razão humana é simplesmente o subproduto de processos irracionais, e, portanto, não confiável” (LEWIS, Miracles, 1947, tradução livre).

Ao tentar explicar a razão por meios irracionais, o naturalismo cai em contradição performativa: ele usa a razão para afirmar que a razão é produto do irracional. Isso, para Lewis, implode a própria estrutura argumentativa do naturalismo, que exige racionalidade para ser defendido, mas nega suas condições de possibilidade.

A razão é uma faculdade que busca a verdade, exige coerência e opera com base em princípios lógicos objetivos; esses princípios não podem ser produto do acaso, da seleção natural ou de impulsos físico-químicos, que operam sem intenção de produzir verdade; logo, a razão humana só faz sentido se for derivada de um princípio racional superior, que transcende a natureza — o que se alinha ao teísmo cristão, onde o Logos (Cristo) é o fundamento da razão e da ordem.

“Se o pensamento racional é meramente o subproduto de causas irracionais, então não pode haver razão para acreditar que ele seja verdadeiro — e, portanto, não há razão para acreditar no naturalismo” (LEWIS, Miracles, 1947).

Wolfgang Smith, físico formado no MIT e filósofo católico, tem desempenhado um papel notável ao questionar os pressupostos filosóficos ocultos no paradigma científico moderno. Em sua obra The Wisdom of Ancient Cosmology (2003), ele propõe uma revisão profunda da visão de mundo moderna, centrada na exclusão da teleologia — isto é, da ideia de que a natureza possui propósitos ou fins intrínsecos.

Segundo Smith, a ciência moderna, desde o século XVII, passou a operar sob um modelo mecanicista e reducionista, no qual os fenômenos naturais são explicados exclusivamente por causas eficientes (o “como” dos eventos), e não mais por causas finais (o “para quê”). Esse modelo, herdeiro do cartesianismo e do empirismo, rompeu com a visão clássica aristotélico-tomista de que o universo é estruturado por finalidades ordenadas e inteligíveis.

Smith argumenta que, ao eliminar a teleologia, a ciência moderna empobreceu sua própria capacidade explicativa. Ela pode descrever movimentos, medir constantes e modelar processos, mas não consegue explicar por que existe ordem, nem por que os seres vivos exibem estrutura, funcionalidade e finalidade. A natureza, por esse modelo, torna-se um agregado de partículas cegas, movidas por leis que “simplesmente existem”, sem razão última. Em suas palavras: “A natureza foi despojada de sua inteligibilidade metafísica e reduzida a um domínio de quantidades mudas — mensuráveis, mas destituídas de sentido” (SMITH, The Wisdom of Ancient Cosmology, 2003, tradução livre).

Smith não rejeita a ciência empírica nem suas conquistas tecnológicas. O que ele propõe é uma reintegração da ciência com a metafísica clássica, de modo que os dados da observação sejam compreendidos dentro de um quadro de significados mais amplo. Isso implica: reconhecer que os entes naturais têm formas, essências e fins próprios; reintroduzir a ideia de hierarquia ontológica (nem tudo é reduzível à matéria); afirmar que a ordem do universo aponta para uma Mente ordenadora, e não pode ser explicada apenas por acaso e necessidade.

Smith sustenta que a crise contemporânea — tanto intelectual quanto existencial — decorre do colapso de uma cosmologia que conectava o mundo visível ao invisível, o físico ao espiritual. Ao reconstituir essa ponte, ele oferece um modelo no qual fé e razão, ciência e revelação, matéria e espírito se tornam esferas complementares, não antagônicas. “O abandono da teleologia não nos libertou da ignorância — apenas nos cegou para as finalidades inscritas na própria estrutura da realidade” (SMITH, The Wisdom of Ancient Cosmology, 2003).

As críticas ao evolucionismo naturalista ultrapassam o campo da teologia e se estendem ao cerne da filosofia da ciência, da epistemologia e da metafísica. As objeções desses autores mostram que o paradigma neodarwinista enfrenta dificuldades teóricas fundamentais para explicar realidades como a consciência, a racionalidade, a origem da informação biológica e os valores morais objetivos. Diante disso, surge uma demanda crescente por modelos explicativos mais abrangentes, que integrem dimensões não materiais da existência à investigação científica.

O erro filosófico do acaso como causa organizadora

O acaso, por definição, é a ausência de direção, intenção e propósito. Ele não possui mente, não visa objetivos e não opera segundo padrões consistentes. Sua natureza é a desordem, a incerteza e a imprevisibilidade. Assim, ao se atribuir ao acaso a origem de sistemas biologicamente complexos e funcionalmente interdependentes — como o código genético, as enzimas reguladoras, ou os mecanismos de replicação celular — incorre-se em um erro filosófico de categoria: trata-se o acaso como se fosse um agente organizador, quando ele é, por definição, o oposto disso.

Como expressa Stephen Meyer: “A aleatoriedade, por si só, não pode gerar informação funcional. [...] A seleção natural só atua depois que uma função aparece. Mas a origem da função é o problema a ser explicado” (MEYER, Signature in the Cell, 2009, p. 108).

Esse raciocínio é reforçado por Douglas Axe, cujos estudos demonstram que a proporção de sequências de aminoácidos que resultam em proteínas funcionalmente dobradas é extremamente pequena: “As sequências funcionais são tão raras que qualquer processo aleatório está fadado ao fracasso em encontrá-las dentro do tempo disponível no universo” (AXE, 2004, p. 1315).

A tentativa de justificar a emergência de estruturas altamente ordenadas e dependentes de relações internas necessárias por meio de tentativas aleatórias e seleção cumulativa esbarra em três barreiras fundamentais:

Tempo insuficiente: mesmo bilhões de anos não são suficientes para que mutações aleatórias explorem de forma eficiente o vastíssimo espaço combinatório das sequências biológicas funcionais (AXE, 2004).

Ausência de informação prévia: a seleção natural só pode operar sobre estruturas já funcionalmente existentes. Ela não cria, apenas filtra — o que requer que a função já esteja presente de forma minimamente eficaz (MEYER, 2009).

A entropia e a ordem local: a geração espontânea de ordem funcional a partir do caos viola o comportamento estatístico da entropia, conforme descrito na Segunda Lei da Termodinâmica. Embora sistemas abertos permitam aumento de ordem local, isso exige um mecanismo direcional de canalização de energia — o que o acaso, por definição, não oferece (SCHÜTZENBERGER, 1967).

Como sintetiza o filósofo Marcel Schützenberger, colaborador do matemático Noam Chomsky: “Não é plausível que um processo cego e aleatório possa gerar as estruturas linguísticas e semânticas presentes no código genético. A teoria neodarwinista está aquém do necessário para explicá-las” (SCHÜTZENBERGER, 1967).

Portanto, o apelo ao acaso como origem da funcionalidade biológica representa uma violação lógica, epistemológica e probabilística. Mais do que uma hipótese científica, trata-se de uma mitologia moderna, onde o acaso é tratado como uma entidade causal ativa — o que equivale a personificá-lo indevidamente.

A realidade da complexidade funcional e interdependente

A natureza é repleta de sistemas altamente interdependentes, cuja funcionalidade só se manifesta quando todas as suas partes estão presentes e operando de forma coordenada. Esses sistemas não funcionam por partes ou por aproximações — funcionam ou não funcionam. Esse tipo de estrutura é conhecido, desde a década de 1990, como complexidade irredutível, termo cunhado por Michael Behe, bioquímico da Lehigh University.

Behe define um sistema irredutivelmente complexo como: “Um sistema único composto de várias partes bem ajustadas e interativas que contribuem para a função básica, e em que a remoção de qualquer uma das partes causa a falha do sistema como um todo” (BEHE, Darwin’s Black Box, 1996, p. 39).

Entre os exemplos mais citados estão o sistema de coagulação sanguínea, composto por mais de 10 etapas bioquímicas que atuam em sequência exata (fatores como fibrinogênio, protrombina, trombina, etc.). Qualquer falha nesse encadeamento resulta em hemorragia ou trombose — não há funcionalidade parcial.

A fotossíntese, cuja eficiência depende da interação precisa entre luz, clorofila, enzimas fotossintéticas e ciclos bioquímicos como o de Calvin-Benson. É um sistema de conversão energética altamente específico, onde cada componente depende dos demais.

O sistema de codificação genética, no qual o DNA só tem sentido funcional se for replicado, transcrito em RNA, traduzido por ribossomos, lido por enzimas reguladoras e interpretado por proteínas — todas também codificadas no próprio DNA. Esse circuito auto-referente e dependente desafia explicações gradativas ou baseadas em tentativas aleatórias.

 Segundo o modelo darwinista clássico, o chamado modelo gradualista, estruturas complexas surgem por acúmulo gradual de modificações vantajosas. No entanto, sistemas irredutivelmente complexos não funcionam em estados intermediários. Uma enzima incompleta não atua parcialmente; um sistema de coagulação sem um fator chave não protege o organismo — ele simplesmente falha.

Behe pergunta: “Como um processo cego e não-direcionado poderia construir algo que exige, simultaneamente, múltiplos elementos interdependentes para funcionar?” (BEHE, 1996, p. 104).

Ordem funcional implica intenção. A lógica implicada é direta: a ordem funcional pressupõe finalidade, e a finalidade pressupõe intenção. Não há como separar a presença de sistemas altamente ordenados e informacionalmente dependentes de uma ação intencional organizadora. Assim, atribuir sua origem ao acaso cego e à seleção natural não responde satisfatoriamente ao problema da origem funcional simultânea.

“A seleção natural pode explicar a sobrevivência dos mais aptos, mas não a chegada dos mais aptos” (BEHE, Darwin’s Black Box, 1996, p. 221).

Exemplos de Complexidade Irredutível

Sistema

Componentes Interdependentes

Consequência da Falha de um Elemento

Coagulação Sanguínea

Fibrinogênio, Protrombina, Fatores VII-XIII, Trombina, Fibrina

Hemorragia ou trombose — o sistema falha completamente

Fotossíntese

Luz, Clorofila, Fotossistemas I e II, Ciclo de Calvin, ATP e NADPH

Fotossíntese ineficaz — sem produção de glicose e energia para a planta

Código Genético

DNA, RNA, Ribossomos, Enzimas de transcrição e tradução, Proteínas reguladoras

O sistema de codificação quebra — proteínas essenciais deixam de ser produzidas

Relações obrigatórias pressupõem design e propósito

A vida na Terra está alicerçada sobre uma rede de interdependências estruturais, que envolvem cooperação, serviço mútuo e funcionalidade cruzada entre organismos e organelas. Estas relações obrigatórias são observadas em diversos níveis da biologia, e não surgem por mera conveniência evolutiva — são pré-requisitos para a existência da vida tal como a conhecemos.

 Exemplos emblemáticos incluem:

Abelhas e flores: as abelhas dependem do néctar das flores para alimentação; as flores, da polinização feita pelas abelhas para reprodução. Trata-se de uma cooperação mútua sofisticada, que exige sincronização comportamental, anatômica e química (SEELEY, 1995).

 Mitocôndrias e núcleo celular: as mitocôndrias fornecem energia (ATP) essencial ao núcleo, enquanto o núcleo provê as instruções genéticas necessárias à replicação mitocondrial. Essa simbiose intracelular é tão estável que muitos biólogos consideram impossível que ela tenha se formado por estágios independentes (LANE, 2005).

Humanos e plantas: seres humanos e animais respiram oxigênio e exalam CO₂; as plantas absorvem CO₂ e liberam O₂. Esse ciclo gasoso só é funcional se as duas partes existirem juntas — sugerindo planejamento conjunto, e não surgimento isolado (MARGULIS; SAGAN, 2002).

Design, não competição. Esse tipo de relação não favorece a sobrevivência isolada de indivíduos, como propõe o paradigma da seleção natural clássica, mas sim a manutenção cooperativa do sistema como um todo.

“A interdependência das espécies em sistemas ecológicos complexos sugere uma arquitetura informacional anterior à emergência dos organismos” (DENTON, 2016, p. 108).

 Ao contrário do modelo darwinista baseado na competição, essas estruturas operam como sistemas de serviço mútuo — algo que requer coordenação funcional desde o início. O biólogo evolucionista Lynn Margulis foi uma das primeiras a desafiar o paradigma competitivo dominante, afirmando que: “A vida não conquistou o mundo pela luta, mas pela rede” (MARGULIS; SAGAN, Microcosmos, 2002, p. 13).

 Limites da seleção natural

A seleção natural, como filtro de mutações aleatórias, não é dirigida e não possui visão de conjunto. Ela favorece vantagens imediatas para indivíduos específicos — e não sistemas inteiros com múltiplas partes em simbiose. Além disso, não há seleção futura: a seleção não pode “planejar” um sistema de trocas funcionais interdependentes.

 O filósofo da ciência Stephen Meyer sintetiza: “Sistemas dependentes de múltiplas partes funcionais não podem surgir por etapas, pois nenhum dos elementos isolados tem valor adaptativo” (MEYER, 2009, p. 115).

 A assinatura moral e relacional do Criador

A Bíblia revela que Deus criou todas as coisas com sabedoria, e que “nEle tudo subsiste” (Colossenses 1:17). Essa subsistência inclui:

  • Leis naturais estáveis
  • Finalidade moral (o bem do outro)
  • Chamado ao relacionamento (o amor como lei do ser)

O universo, portanto, não é um agregado de partes soltas, mas um organismo vivo interconectado, que reflete o caráter relacional do Criador:

“Façamos o homem à nossa imagem...” (Gênesis 1:26) — pluralidade relacional desde a origem.

Se o Criador é amor (1 João 4:8), então Sua criação também refletirá serviço mútuo, interdependência, vínculo e ordem.

Conclusão: O colapso filosófico da evolução cega

Ao observarmos a natureza — desde os átomos aos ecossistemas — percebemos que:

  • A ordem é real
  • A relação é estrutural
  • A cooperação é indispensável
  • O propósito é evidente

Portanto, atribuir ao acaso a origem de um universo funcional, relacional e moralmente estruturado é não apenas insuficiente, mas logicamente insustentável.

A criação clama por um Criador — não qualquer um, mas Um cuja mente concebe a beleza, cuja vontade deseja o bem e cuja natureza é amor.

Referências

BEHE, Michael. Darwin’s Black Box: The Biochemical Challenge to Evolution. New York: Free Press, 1996.

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DENTON, Michael. Evolution: Still a Theory in Crisis. Seattle: Discovery Institute Press, 2016.

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LEWIS, C. S. Milagres. São Paulo: Martins Fontes, 2005. (Original de 1947)

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MARGULIS, Lynn; SAGAN, Dorion. Microcosmos: Four Billion Years of Microbial Evolution. Berkeley: University of California Press, 2002.

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NAGEL, Thomas. The Last Word. Oxford: Oxford University Press, 1997. p. 130.

NAGEL, Thomas. Mind and Cosmos: Why the Materialist Neo-Darwinian Conception of Nature is Almost Certainly False. Oxford: Oxford University Press, 2012.

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SCHÜTZENBERGER, Marcel-Paul. Algorithms and the Neo-Darwinian Theory of Evolution. In: Moorhead, P. S.; Kaplan, M. M. (Eds.). Mathematical Challenges to the Neo-Darwinian Interpretation of Evolution. Philadelphia: Wistar Institute Press, 1967, p. 73–75

SCRUTON, Roger. The Soul of the World. Princeton: Princeton University Press, 2014.

SEELEY, Thomas D. The Wisdom of the Hive: The Social Physiology of Honey Bee Colonies. Cambridge: Harvard University Press, 1995.

SMITH, Wolfgang. The Wisdom of Ancient Cosmology: Contemporary Science in Light of Tradition. Oakland: Angelico Press, 2003.