domingo, 3 de agosto de 2014

Cooperação em ciência, tecnologia e inovação e educação nos países amazônicos

Artigo publicado na revista Ciência e Cultura vol.66, no.3, São Paulo set. 2014,  Núcleo Temático: Amazônia Sem Fronteiras (uma publicação da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC)

 




Claudio Ruy Vasconcelos da Fonseca


O Fórum Mundial de Ciência ocorrido no Rio de Janeiro em novembro de 2013 discutiu a necessidade de mudanças nas relações internacionais, considerando que os sistemas econômico e de transporte quase tornaram extintas as distâncias horizontais que separavam os mercados planetários. Tal situação provocou mudanças profundas nas dinâmicas ambientais e no comportamento social, transformando problemas, outrora localizados geograficamente, em grandes enigmas globais. A complexidade dos problemas ambientais está a requerer soluções inovadoras que, por sua vez, exigem articulações multinacionais (pesquisas e tecnologias) e mudanças no domínio diplomático-científico.
A produção do conhecimento vem sendo considerada tarefa central para quase todos os países e, neste contexto, a transformação através de uma sociedade do conhecimento é o caminho para assegurar prestígio e competitividade (1). Pesquisa passa a ser encarada como parte da atividade econômica requerendo ações de agregação nos vários níveis espaciais.
No caso específico dos países amazônicos, estudos que avaliam pressupostos desta natureza são escassos e pouco é discutido sobre a dimensão regional da produção colaborativa de conhecimento, a despeito de se considerar a cooperação relevante às políticas de ciência e tecnologia dos países. Indicadores de produção de ciência no século XXI demonstram que colaboração científica é a característica predominante no mundo (2). Trabalhos em coautoria formam 50% de toda publicação científica atual (3).

O PROCEDIMENTO DO BRASIL
A literatura que analisa a cooperação científica internacional, do ponto de vista político e estratégico, enxerga alguns impulsionadores para as publicações em coautoria entre países nos vários continentes (3): i) A emergência de alguns países (ex. Brics) com desenvolvimento de pesquisas e tecnologias reconhecidas como compatíveis com os padrões internacionais; ii) o crescimento do debate sobre as mudanças globais, sustentabilidade energética e segurança em saúde; iii) a globalização da pesquisa e desenvolvimento acelerada pela mobilidade dos pesquisadores, atualmente mais visível na pesquisa industrial; iv) o crescimento demográfico e o decréscimo de capital humano para ciência e engenharia, resultando na escassez de talentos, o que torna a colaboração uma via para atrair talentos de países parceiros; v) a ampliação dos debates sobre políticas e aspirações para prover mais massa crítica e perfil internacional de excelência em pesquisa e, nesta conjuntura, a parceria com o melhor desempenha papel decisivo.
No espaço pan-amazônico, os impulsionadores acima podem ter especial relevância para países com razoável desenvolvimento científico e tecnológico, e não para a região como um todo, considerando que há assimetrias acentuadas entre os países e mesmo no interior destes. Tal situação impõe a adoção de estratégias políticas para ciência e desenvolvimento particulares para cada país, o que pode ser um fator complicador na cooperação regional.
Olhando a América do Sul do ponto de vista econômico, os indicadores mostram que o Produto Interno Bruto (PIB) gerado no continente corresponde a US$ 4.797 bilhões; somente o Brasil é responsável por US$2.324 bilhões, correspondendo a 48,44% do PIB sul-americano. Aliado a isso, o Brasil aplica 1,07% do PIB em pesquisa e desenvolvimento (P&D), correspondendo a 63,5% do investimento latino-americano em P&D (5). Tais números estão refletidos na infraestrutura brasileira de pesquisa e na quantidade de pesquisadores (cerca de 300 mil) no sistema de ciência e tecnologia (C&T) nacional. Em virtude desses índices, o Brasil assume um papel crítico para o desenvolvimento dos sistemas de C&T nos países amazônicos. Em termos globais, os referidos países têm participação periférica no PIB mundial, sendo que corresponde ao Brasil 2,9% do total; o investimento em C&T corresponde a 1,8% do total mundial, embora o investimento relativo ao setor privado seja ainda insignificante. Países desenvolvidos tais como Estados Unidos e Japão contribuem respectivamente com 32,6 e 12,9% do investimento mundial em C&T (6). Nos relatórios aqui investigados não são contabilizados os índices para os investimentos amazônicos em C&T; no entanto, pode-se inferir o "fosso" existente entre a pan-Amazônia e o mundo desenvolvido, tomando-se como exemplo a dinâmica brasileira de investimentos realizados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) onde, para a região Norte, em 2013, foram liberados recursos da ordem de R$20 milhões em projetos de pesquisas, sendo que para a região Sudeste os mesmos investimentos somaram R$240 milhões. Tal desequilíbrio parece representar a situação dos investimentos em C&T à pan-Amazônia comparados com as regiões mais desenvolvidas do mundo. Essa condição gera internamente expectativas políticas que prontamente requerem maior equilíbrio.

OS GRUPOS DE PESQUISAS
Análises sobre a produção de conhecimento demonstram a tendência global de publicações em coautoria (4; 5). Há aumento na colaboração científica e nas ligações entre ciência e tecnologia, encorajando a colaboração entre academia e empresas, o que torna importante a mobilidade de pesquisadores nos âmbitos nacional e internacional. Afortunadamente, a comunicação eletrônica tem se tornado excelente meio para formação de grupos de pesquisa multinacionais e, nesse espaço, a cooperação entre grupos em proximidade geográfica se intensifica (6), e mesmo a cooperação entre grupos não simpátricos ocorre mais livremente, porque a distância horizontal deixa de ser fator de isolamento.
Alguns arquétipos podem ser observados na promoção da cooperação científica, tais como: i) mudanças nos padrões de financiamento de pesquisas; ii) imperativo de infraestruturas complexas; iii) a necessidade de aumentar o fluxo de ideias e técnicas; iv) carência de visão multidimensional sobre problemas complexos; v) fatores analíticos, que determinam o impacto das publicações; vi) a correlação positiva entre número de coautorias e a probabilidade de publicação. Há ainda o caso do decréscimo de pesquisadores em algumas regiões do mundo, fato que constrange o aumento da cooperação. Por outro lado, é importante dizer que trabalhos individuais também produzem impacto relevante desde que os resultados tenham níveis de generalização altos (4).
Um diagnóstico sobre a cooperação científica entre os países amazônicos deve ser precedido de uma verificação dos sistemas de C&T nos vários países que integram a região. Assim, um documento importante sobre o estado da ciência nessa região é o relatório da Unesco (2). Há, em países como o Brasil, Colômbia e Peru, algumas ilhas de excelência que significam polos de capacidade que podem se tornar motores para o desenvolvimento regional, mas há necessidade de políticas regionais adequadas que possam representar um alicerce importante de promoção do diálogo multinacional. O número de trabalhos em coautoria entre cientistas dos países amazônicos é desconcertantemente baixo (7), mesmo em campos do conhecimento onde se esperaria maior relacionamento. Historicamente, o volume maior de cooperação realizado por países amazônicos sempre se deu com Estados Unidos e países europeus, chegando a representar 73% dos trabalhos em coautoria (3). Esta situação é paradoxal considerando que os países amazônicos têm realiza do muitos acordos de cooperação sendo que este assunto é um dos itens da agenda estratégica da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA). Mas, existem explicações para esse fato.
Os países sul-americanos que, além do Brasil, são frequentemente citados nos principais índices internacionais (base de dados ISI/Thomson Reuters, Scopus, entre outros) são Argentina e Chile. Os países amazônicos (excetuando o Brasil) não estão entre os de produção significante, embora haja muito conhecimento oriundo deles. Esse fato desestimula e, de certo modo, dificulta a cooperação entre os países amazônicos. No entanto, tem havido esforços para promover a coparticipação científica através de entidades regionais, como a Associação de Universidades Amazônicas (Unamaz) (criada em 1987), uma iniciativa de docentes e pesquisadores dos oito países amazônicos durante o Seminário Internacional "Alternativas de Cooperação Científica, Tecnológica e Cultural entre Instituições de Ensino Superior dos Países Amazônicos (Citam)". Nos últimos dois anos, a OTCA tem estimulado maior integração regional, mas há ainda grandes desafios a superar considerando as desigualdades nas estruturas de C&T dos países signatários da organização.

COOPERAÇÃO CIENTÍFICA EM AMBIENTES DESIGUAIS
A Rede Interamericana de Academias de Ciência declarou que durante o século XXI, qualquer planejamento para inclusão social e fortalecimento de sistemas de governança deverá levar em consideração aplicação extensiva de conhecimento científico, inovação e educação em ciências (8). Chaimovich (9) propõe algumas indagações muito oportunas quando o assunto é ciência e desenvolvimento: ciência competitiva ou colaborativa? Local ou internacional? Quais são os mecanismos de cooperação internacional adequados?
Cooperação científica entre ambientes desiguais pressupõe ajustes a priori, sem o que não haverá como contribuir. Uma das disparidades no ambiente amazônico ocorre em relação aos modelos de ensino superior. Os jovens estudantes necessitarão ter currículos escolares equiparados para que as universidades ofereçam níveis semelhantes de preparo profissional. Isto já ocorreu na Europa desde o início dos anos 2000, onde o ensino superior está igualado, sendo que os alunos pertencem ao sistema europeu de ensino, com possibilidades de ampla mobilidade interna, de modo que possam ter acesso sempre aos melhores professores, além de diplomas prontamente reconhecidos no espaço europeu, visando empregabilidade.
Aprimoramentos no sentido da criação de um sistema educacional comum para os países membros da OTCA poderiam ser uma alavanca para antecipar o desenvolvimento da região, mas não seria uma tarefa trivial. A infraestrutura para o sistema de C&T na Amazônia continental ainda não é suficiente e nem integrativa. Não existem plataformas computacionais que unifiquem informações e possam criar indicadores sobre os avanços científicos, permitindo planejamentos consistentes e visão das prioridades. Além do Brasil, nenhum dos países amazônicos possui banco de dados dos recursos humanos em C&T e, tampouco, acesso à literatura de forma rápida e completa, tal qual oferecem a plataforma Lattes do CNPq (http://lattes.cnpq.br) e o Portal de Periódicos da Capes (http://www.periodicos.capes.gov.br). No entanto, poder-se-ia oferecer ao ambiente pan-amazônico possibilidades para acesso à Plataforma Lattes, por exemplo, como política de integração regional, dando visibilidade imediata ao conjunto de pesquisadores amazônicos, além de explicitar os grupos de excelência e suas áreas de atuação. Tal conexão favoreceria a concepção de programas de pós-graduação com financiamento internacional (bolsas e mobilidade) onde se pudesse reunir a capacidade científica amazônica, além de harmonizar um perspicaz olhar sobre as demandas do setor produtivo regional, proporcionando formação empreendedora. Esses programas deveriam fornecer ao aluno informações sobre a realidade econômica regional e suas políticas de ampliação, as suas convergências e tendências desenvolvimentistas, bem como oportunidades de participação, como observadores, em reuniões com tomadores de decisões, onde são discutidos os problemas regionais, de modo a criar lideranças vigorosas.
Em 2010 o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) realizou uma oficina de planejamento juntamente com a Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) para promover ações conjuntas no sentido de respaldar o desenvolvimento do chamado baixo Amazonas. Foram convidadas lideranças científicas e de instituições de fomento, além de líderes do setor produtivo, para que houvesse um ajuste na mirada acadêmica sobre a realidade local. O relatório resultante mostrou haver ampla desconexão entre os interesses da academia regional e as demandas efetivas do setor produtivo, ou seja, os currículos dos cursos de graduação e os programas de pós-graduação, especialmente estes últimos, não estavam voltados à expectativa do conhecimento requerido pelo setor produtivo. Em outras palavras, é lamentável que estejamos formando cientistas com menor capacidade para refletir sobre as implicações socioeconômicas de suas práticas. Muito provavelmente, a mesma situação deve repetir-se nos programas de pós-graduação dos demais países amazônicos. A integração de todos os sistemas de conhecimentos proporcionaria ambiente para enfrentar problemas complexos (tais como a segurança alimentar, saúde coletiva, desastres naturais e mudanças climáticas), mas que exigem soluções perspicazes.
A ciência pan-amazônica deverá ser competitiva em relação a outros espaços geopolíticos, mas, deverá ser cooperativa interna e externamente. Assim, os mecanismos de coparticipação deverão ser discutidos e ampliados para que não sejam preteridas as oportunidades individuais de cada nação e tampouco da região. A criação de uma atmosfera de economia baseada no conhecimento necessita de um espaço de intensa cooperação.
Os indicadores educacionais globais mostram outra realidade que necessita ser modificada: a da não existência de universidades de nível mundial na pan-Amazônia. Nenhuma universidade regional ocupa classificação entre as duzentas ou trezentas mais importantes nos vários índices publicados (World University Rankings; QS World University Rankings; Academic Ranking of World Universities) que medem a qualidade do ensino, quantidade e impacto das pesquisas, transferência de conhecimento e tecnologia e visibilidade internacional. Mesmo no ranking latino-americano, somente a Universidade Federal do Pará (UFPA) aparece entre as duzentas mais importantes, ocupando a 124ª posição (QS Latin American University Rankings). O paradoxo regional é que a influência do conhecimento gerado na pan-Amazônia é apenas tangencial quando se trata do desenvolvimento local. As indústrias e a sociedade amazônicas não são entusiasmadas pelo conhecimento produzido nas academias e estas, por sua vez, também não consideram o referido conhecimento como substrato para aprimoramento das suas atividades (10). As regiões periféricas na América do Sul ressentem-se de lideranças que possam sustentar problemas cada vez mais complexos e oferecer soluções compatíveis com a realidade regional e com as questões mundiais.
Considerando que a ciência produzida na Amazônia carece de níveis maiores de generalização e, consequentemente, é pouco citada por cientistas de outras latitudes, será imperioso que as universidades amazônicas busquem diligentemente maior internacionalização e novas formas institucionais. A criação de espaços internacionais para cursos bilaterais ou multilaterais poderá permitir a mobilidade docente e discente, promover capacitação científica e visibilidade, além da interdisciplinaridade (11).
O panorama da formação de capital humano de alta capacidade cognitiva na Amazônia continental não é alvissareiro ponderando que, em 2010, segundo dados da Rede de Indicadores de Ciência e Tecnologia Iberoamericana e Interamericana (Ricyt), havia 20.818 titulados em mestrados e 2.498 em nível de doutorado para os países da pan-Amazônia, exceto o Brasil, sendo que este formou no mesmo período 39.590 mestres e 11.314 doutores. Internamente, na Amazônia brasileira, há 6.412 alunos matriculados em programas de pós-graduação, mas os números se tornam pífios quando comparados com o estado de São Paulo que inclui 56.941 alunos matriculados no sistema de pós-graduação (12). No tocante à fixação de recursos humanos, a região Amazônica deve tornar-se atrativa para pesquisadores, especialmente jovens, mas também aos sêniores, de modo a criar massa crítica que possa produzir um efeito multiplicador pujante.
A modificação dos indicadores vistos acima é imperativa para a consolidação da nova geopolítica regional, a qual coloca a Amazônia como área fulcral para integração continental (13). Há, no panorama comercial, fortes indicativos de um alinhamento, ainda mais intenso, das economias mais importantes da América do Sul (Brasil, Argentina, Chile, Venezuela) através do Mercosul, sendo que este bloco comercial começa a interessar outros países latino-americanos e africanos. Trata-se, atualmente, de um mercado com 250 milhões de consumidores que, a semelhança de consumistas de outros mercados começam a tomar consciência das expectativas do mercado verde e, nesse contexto, a pesquisa amazônica emerge como a esperança para a sustentabilidade e a substituição dos modelos econômicos vigentes. Mas, há os que apostam na hostilidade do ambiente amazônico e no determinismo ecológico, que impulsionam as centenas de habitantes locais à estagnação econômica, ausência de empregabilidade e de renda (13). Contra esta situação, será necessária a cooperação científica e programas de integração compartilhados que construam a infraestrutura necessária (estradas, energia, ciência e tecnologia, etc) para alcançar vantagem competitiva.

PRIMEIRO MUNDO X TERCEIRO MUNDO
A imensa riqueza natural disponível no território pan-amazônico desafia os sistemas de ciência, tecnologia e inovação dos respectivos países a competir com o chamado primeiro mundo. Contudo, esse clima de desafios não poderá desencadear concorrência intracontinental predatória, levando à erosão da cooperação. Assim, o surgimento de uma diplomacia científica para estabelecer cooperação continental pacífica seria providencial. Neste sentido, o Brasil deveria exercer liderança segura considerando seu forte potencial científico e sua tradicional posição conciliatória. O tema da sustentabilidade planetária implica em sustentabilidade ambiental, econômica e social nos níveis continental e singular de cada país, desafios próprios do crescimento complexo, este requerendo esforço gigantesco de pesquisa.
O panorama mundial assinala que a grande fronteira hoje em expansão, no debate por liderança econômica, política e militar, situa-se, sobretudo, no domínio e controle sobre o conhecimento essencial à competitividade e à inovatividade. A produção de informação nova requer, cada vez mais, o esforço compartilhado entre pares, inclusive aqueles situados em contextos nacionais e institucionais diversos. Assim, a cooperação internacional deverá considerar essa tensão entre o crescimento da competitividade e a necessária produção colaborativa de conhecimento. Abrem-se novos tempos para uma possível democratização do acesso à informação e sua assimilação social em favor de um desenvolvimento em novas bases, sob distintos pontos de vista. No plano da geopolítica, coloca-se o desafio da desconcentração do conhecimento, beneficiando a manifestação de novos atores, com o surgimento de novas alianças e articulações advindas dos interesses estratégicos (energia, recursos naturais) vistos como capital de realização futura a mercados promissores. Haverá também a indicação de novas práticas de pesquisas que poderão dar ensejo a agendas de iniciativas de colaboração internacional em C&T, com simetria de benefícios e reciprocidades às partes, ainda que em situações distintas no jogo de forças internacional.
O reforço na cooperação entre países da região robustece as bases de negociação de eventuais iniciativas conjuntas com outros blocos regionais - por exemplo, a União Europeia - contribuindo para resolver dissonâncias em acordos de cooperação internacional e corrigir equívocos de ordem estratégica. É esta perspectiva que irá permitir o enfrentamento da questão dos "privilégios acumulados [de uns poucos] versus necessidades não respondidas [da maioria]", abrindo espaço para a priorização de temas.
A comunicação entre ciência e sociedade deverá ser expandida. Cientistas devem examinar problemas relevantes ao seu meio. Deve haver esforço, no âmbito governamental, no sentido de evitar a fragilidade das instituições de pesquisas e prevenir a drenagem de cérebros (braindrain). A cooperação assistencialista é outro fator que deve ser evitado, onde países desenvolvidos apenas utilizam o aumento da capacidade científica e tecnológica em países em desenvolvimento, sem haver reciprocidade no reconhecimento da relevância da ciência gerada nesses territórios.
Ações de pesquisa que sejam efetuadas no âmbito da pan-Amazônia acessando o patrimônio genético, o conhecimento tradicional e a proteção do conhecimento, pressupõem a harmonização de marcos legais. De outro lado, deverá haver diligências para que os pesquisadores, em qualquer parte da pan-Amazônia tenham acesso à literatura científica internacional, além de maior visibilidade relativa à produção científica. Para tal, será necessária a promoção da excelência em pesquisa com elevação do nível de competitividade para garantir financiamento aos centros de excelência. Uma forma de alcançar competitividade se dá através do incremento da infraestrutura, buscando facilidades multilaterais entre os Estados amazônicos, para concretizar programas de suporte a infraestrutura que sejam transestaduais, para aquisição de equipamentos e para cooperação e interoperacionalidade de instalações visando realizar ou aumentar atividades complementares.
Se se pretende alcançar melhor desempenho científico na Amazônia continental, então deverá haver significativa melhora na operacionalidade da internet regional, aumentando sua capacidade para Mbits/seg e depois para Gbits/seg. Também será necessária a criação de mecanismos recíprocos de informação, e formação de comissão intergovernamental regional com a finalidade de promover os meios logísticos e instrumentos legais para coordenar as atividades regionais de pesquisas. Uma das iniciativas à concretização dessas demandas deverá ocorrer no âmbito do Observatório Regional Amazônico, uma ação da OTCA, em reunião realizada no Inpa em setembro de 2012. O observatório terá a finalidade de elaborar estudos de interesse para a região. Incluirá a Plataforma de Cooperação na Área Ambiental, constituída por um sistema de informação integrado, com ênfase na biodiversidade, além de um serviço regional de capacitação. A geração de novas condições socioeconômicas para a Amazônia continental, com equiparação cognitiva, passa pelo compartilhamento de informações; isto requer um gigantesco esforço regional.
As informações disponíveis, na literatura científica, sobre o papel da Amazônia mostram a sua importância para a segurança ambiental planetária. Mas, deve também ser abordada como essencial para a diversificação da base econômica continental, notadamente agora, quando o mundo discute mudanças econômicas em direção à chamada bioeconomia e, neste aspecto, deve-se pensar nos recursos da biodiversidade em nível tecnológico avançado. Conforme a Academia Brasileira de Ciências (ABC) (14) a Amazônia é o desafio do século XXI e deve ser um modelo de desenvolvimento que não destrua o patrimônio natural, mas que receba investimentos suficientes para reduzir o atraso relativo em comparação a outras áreas com maior densidade tecnológica. É urgente entender que não é utopia o fato de que na Amazônia está em andamento a transformação de benefícios da natureza em mercancias (15).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Hoekman, J.; Frenken, K; van Oort, F. "The geography of collaborative knowledge production in Europe". Ann Reg Sci 43:721-738, 2009.
2. United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization. Unesco Science Report 2010. Paris, 2010.
3. Meyer, M.; Bhattacharya, S. "Commonalities and differences between scholarly and technical collaboration an exploration of co-invention and co-authorship analyses". Scientometrics 61(3):313-323, 2004.
4. Wagner-Doebler, R. "Continuity and discontinuity of collaboration behavior since 1800 - from a bibliometric point of view". Scientometrics 52(3):503-517, 2001
5. Edler,J.; Cunningham, P.; Flanagan , K. "Drivers of international collaboration in research". 2009.http://www.technopolis-group.com. Acessado em 28/03/2014.
6. Katz, J.S.; Martin,B.R. "What is research collaboration?" Res Policy 26(1):1-18, 1997.
7. Frenken,K; Holzl,W.; de Vor,F. "The citation impact of research collaborations: the case of European biotechnology and applied microbiology (1988-2002)". J Eng Technol Manage 22(1-2):9-30, 2005.
8. Escalona-Fernandez, M.I; Pulgarin-Guerrero, A.; Oliveira, E.F.T; Maria Claudia Cabrini Gracio, M.C.C. "Scientific collaboration network among Brazilian Universities: an analysis in dentistry area". Brazilian Journal of Information Science. 6(1):16-38, 2012.
9. Chaimovich, H. In: Foreign relations meeting with representatives of the civil society on the Fourth Summit of the Americas. Mar del Plata, 2006.
10. Chaimovich, H. In: Cooperacao Internacional na Era do Conhecimento. Brasilia: Centro de Gestao e Estudos Estrategicos, 2010.
11. Fonseca, C. R. V. O "Arduo caminho para a consolidacao do sistema de ciencia e tecnologia amazonico". T&C Amazonia, 10(21):4-8, 2011.
12. Banco Interamericano de Desarrollo. Ciencia, Tecnologia e Innovacion en America Latina y el Caribe.http://www.iadb.org, acessado em 28/03/2014.
13. Silva, F. C. T. "Amazonia: regiao-pivot da integracao sul-americana".http://www.blogdoalon.com/ftp/amazonia_pivot.pdf, acessado em 13/04/2014.
14. Academia Brasileira de Ciencias. Amazonia: desafio brasileiro do seculo XXI. Sao Paulo: Fundacao Conrado Wessel, 2008.
15. Becker, B. "Geopolitica da Amazonia". Estudos Avancados 19(53), 2005.


Claudio Ruy Vasconcelos da Fonseca é coordenador de biodiversidade e pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), diretor geral da Associação Brasileira para o Uso Sustentável da Biodiversidade da Amazônia e professor da Universidade do Estado do Amazonas (Uea). Email: rclaudio@inpa.gov.br