Minha graduação foi concluída em
Belém, Pará, na Universidade Federal do Pará (UFPA), naquele então, a melhor
universidade do norte brasileiro. Prosseguir estudo de pós-graduação ainda não
era muito comum, tampouco se falava muito em mestrado ou doutorado. Mas, como
havia concluído Licenciatura Plena em Biologia, minha perspectiva de entrar
para pesquisa científica era escassa, sem que investisse num mestrado. Durante
a graduação tive apenas um professor com doutorado, o qual era norte americano
e estava chegando para trabalhar no Museu Paraense Emilio Goeldi (MPEG). Ele me
impressionou muito com seu saber e, desde meu primeiro contato com ele, percebi
a diferença quando comparado aos outros professores. Assim, decidi que faria
pós-graduação, sabendo das dificuldades. Embora não percebesse ainda, Deus
estava promovendo minha carreira, colocando diante de mim vários modelos. Portanto,
busquei saber as opções para os estudos avançados e tudo apontava para saída ao
exterior. Todavia, o plano de Deus para minha vida passou a marcar meu percurso
com firmeza, ainda que eu não o sentisse. Meu Pai conhecia o pró-reitor de
ensino e pesquisa da UFPA, e numa das suas conversas ele disse ao meu Pai: por que
seu filho quer ir para o exterior se há em Manaus, no Instituto Nacional de
Pesquisas da Amazônia (INPA) um excelente programa de pós-graduação com docentes
internacionais? Naquela ocasião, eu já havia buscado estágio de iniciação
científica no MPEG. Meu orientador, um pesquisador bem jovem oriundo dos
Estados Unidos, me deu todo suporte e, sem que eu demandasse, ele me chamou e
declarou o seguinte: tenho observado seu desempenho e acho que posso lhe
oferecer uma bolsa. Aqui está uma passagem para que você vá até o INPA, em
Manaus, e fale com o diretor solicitando bolsa. Consequentemente, tomei um voo
até Manaus e prontamente fui atendido pelo então diretor do INPA, o qual me
concedeu a bolsa com o mesmo valor oferecido a um aluno de mestrado. Assim, percebi
que meu orientador estava como que me fazendo assumir um compromisso de ser
aprovado na próxima seleção ao mestrado do INPA.
Os meses se passaram, conclui a
graduação e o edital para seleção ao mestrado do INPA foi finalmente publicado.
Em dezembro de 1977, uma semana antes do natal, foi marcada a aplicação das
provas. A referida seleção era aplicada em todo Brasil, assim como em alguns
países, incluindo Canadá e Estados Unidos. Na verdade, o diretor do INPA, um
cientista destacado no cenário científico, buscava pinçar uma elite cosmopolita
de jovens que pudessem alavancar as pesquisas no Amazonas. As provas duravam três
dias. Versavam sobre Matemática, Física, Química, Genética, Português, Inglês, além
da prova específica da especialidade escolhida. Era como vestibular. No
entanto, a data marcada para o início das provas coincidia com o sábado, assim
que eu não poderia realizar os exames por minha fidelidade ao princípio da
guarda do sábado. Informei ao meu orientador que não faria os exames, causando
nele uma tristeza grande, em virtude do seu investimento. No dia da aplicação
da primeira etapa não compareci. Fui à igreja para a celebração do sábado, como
de costume, esquecendo-me daquele exame. Mal podia perceber que havia um plano
em execução. Quando cheguei em casa de volta, o telefone tocou e, ao atende-lo,
uma colega que também fizera sua inscrição me perguntou se eu estava ciente do
corrido. Disse-lhe que não estava ao que ela me informou que a primeira etapa
tinha sido adiada para a próxima segunda-feira, em virtude de um incidente: aos
membros da banca que aplicariam os exames, a comunicação oficial do INPA
determinava o início para 08:00 horas; para os candidatos, a comunicação dava o
início das provas para 09:00 horas. Todavia, o edital assinalava que após 30
minutos do início nenhum candidato poderia ser admitido. Aconteceu que todos os
candidatos chegaram além dos 30 minutos estipulados, provocando ausência de
todos. Por esse motivo, alteraram a data inicial. Ao receber essa notícia, me
dei conta que Deus estava agindo e entendi que Ele havia planejado minha ida
para Manaus e para o INPA. Bem, concluídas as provas, logo depois veio o resultado:
eu fora aprovado em primeiro lugar.
Embora não tivesse consciência cabal
do que estava acontecendo em minha experiencia, meu primeiro ciclo de vida na casa dos
meus pais e em Belém estava encerrando; começaria uma nova etapa.
Em fevereiro de 1978 cheguei ao
INPA. Tomei um taxi no aeroporto de Manaus e me dirigi ao instituto onde fui recepcionado pelo
diretor. Depois fui alojado em um dos apartamentos institucionais, no próprio
campus do INPA. Logo em seguida, passei para uma das residências onde morei por
dois anos. A comunidade de alunos era composta por brasileiros de muitos
estados e estrangeiros sul-americanos, norte-americanos e europeus.
No início do segundo ano, precisamente em
abril de 1979, fui chamado pelo diretor, ocasião em que me ofereceu uma vaga
como assistente de pesquisa. Fui tomado de surpresa porque não havia percebido
que Deus queria que eu me fixasse em Manaus. Pensei um pouco e decidi aceitar,
com a perspectiva de poder sair para outra experiência, caso essa não preenchesse
minhas expectativas. Logo passei a ganhar um salário melhor e terminei o meu
mestrado já na condição de pesquisador. Imediatamente comecei minhas gestões
para o doutorado. Enquanto fazia o mestrado, conheci um pesquisador muito
famoso, o qual viera do Smithsonian Institution, o melhor instituto de pesquisas
do mundo. Este pesquisador perguntou-me se gostaria de fazer um doutoramento
nos Estados Unidos sob sua orientação, assim que comecei a preencher os formulários
e logo estava aceito para ir ao Smithsonian. Todavia, um plano superior estava
em andamento, conforme dito acima, sem que eu percebesse Deus conduzia meu
futuro. E sob essa ordem, os planos mudaram. Aconteceu que, após umas semanas,
passava pelo INPA um outro famoso pesquisador brasileiro, docente na
Universidade de São Paulo (USP), que assistiu um seminário por mim proferido e,
ao final, do nada, ele disse-me que eu deveria me inscrever ao doutorado na
USP. Argumentei que já estava aceito para o Smithsonian, mas ele foi enfático e
quase obrigou-me a dar-lhe meus documentos para que ele me inscrevesse na USP.
Assim, fiz o exame de admissão ao dourado na USP. Dos 14 inscritos passaram
apenas 4 sendo eu um deles. Após isso, o professor que me levou à USP disse-me
que a vinda para São Paulo somente seria entendida mais tarde. Assim, confiei e
realizei minha matrícula. Deus estava dando andamento ao seu plano e o segui
sem ter muita noção. Logo percebi que estava num ambiente de altíssima cognição.
A USP é uma universidade onde se
respira vanguarda. Em todos os lugares ouvia de assuntos que jamais havia
entrado em contato. Aquele ambiente me estimulou a buscar por informações que
pudessem fornecer um lastro cognitivo mais denso. Gastei quatro anos com um
ritmo acelerado de leitura, não perdendo nenhuma das oportunidades para ouvir
grandes nomes da ciência, até mesmo para assuntos que não estavam relacionados diretamente
com minha opção de estudo. Era muito diferente da UFPA, muito além do INPA. Neste
ambiente fui construindo uma formação mais plural e, desta forma, aprendi a
raciocinar com muitas variáveis, coisa muito nova para mim. Terminei meu
doutorado com uma base cognitiva bastante diferente daquela que obtivera até o
mestrado. Mas, ainda sentia que não estava pronto. Voltei ao INPA e não parei
de estudar ciência, sua metodologia, sua lógica. Percebo hoje com clareza
meridiana o que aconteceu comigo. Fui exposto a muita luz e, como consequência,
não deixei de agradecer ao bom Deus e aos grandes mestres por esse inestimável
privilégio. Alguns anos depois fui ao Smithsonian e, ao ver a realidade de
brasileiros que faziam seu doutorado lá, pude comparar a minha formação com a
deles. Eram bons técnicos, mas não haviam adquirido a experiencia por mim vivida
na USP. Como vemos, às vezes o imediatismo pode ser prejudicial. Sempre pensamos
que os Estado Unidos são necessariamente melhor opção do que o Brasil.
O que resultou por causa do
respaldo cognitivo oferecido pela USP? Vários foram os resultados. Vou apenas
citar um deles. Ao regressar ao INPA, fui procurado por pesquisador do
Instituto Max Planck, uma das mais importantes instituições científicas da Alemanha.
Na ocasião, desenvolviam um projeto em todo cinturão tropical do mundo, buscando
verificar quais mecanismos estão envolvidos na manutenção da biodiversidade
tropical. Manaus era um dos locais, assim que necessitavam um pesquisador para
ser a contrapartida brasileira. Após as assinaturas começaram os trabalhos e
uma equipe de pesquisadores alemães e brasileiros passou a visitar Manaus, na
etapa de levantamento dos dados. Após quatro anos de trabalhos, o governo
alemão galardoou-me com uma visita a Alemanha para assistir, em caráter extraordinário,
as avaliações que o ministério da Ciência promove, com um rigoroso exame dos
resultados alcançados pelos pesquisadores, os quais são avaliados por uma banca
de decanos, uma espécie de prestação de contas ao recurso empregado,
verificando se o retorno foi suficiente ou causou prejuízo, e nesse caso, com
penalizações. A referida reunião é fechada sendo que eu fui o primeiro
estrangeiro a participar, na condição de representante do governo brasileiro.
Após as reuniões, fui agraciado com um prêmio que me deu a oportunidade de
conhecer instituições de pesquisas em países europeus.
O objetivo deste texto é
demonstrar a importância do servir a Deus. Na busca dos meus sonhos não preteri
a Deus guardando os princípios celestes. Jamais transgredi o sábado. Deus ainda
está no comando do seu plano para a minha vida. Sei que cuidará do meu futuro
e, seja qual seja o desfecho, será sempre o melhor. Hoje posso retrover minha
vida e reconheço a presença de Deus em todos os caminhos percorridos. Deus tem
sido o meu escudo. Durante quase quarenta anos em Manaus, não sofri com nenhuma
das doenças tropicais tão comuns na Amazônia. Alcancei nível de respeitabilidade
entre meus pares e pude interferir na vida de outros que vieram a mim em busca
de auxílio.