segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

A sustentável leveza da gerência de Deus


Minha graduação foi concluída em Belém, Pará, na Universidade Federal do Pará (UFPA), naquele então, a melhor universidade do norte brasileiro. Prosseguir estudo de pós-graduação ainda não era muito comum, tampouco se falava muito em mestrado ou doutorado. Mas, como havia concluído Licenciatura Plena em Biologia, minha perspectiva de entrar para pesquisa científica era escassa, sem que investisse num mestrado. Durante a graduação tive apenas um professor com doutorado, o qual era norte americano e estava chegando para trabalhar no Museu Paraense Emilio Goeldi (MPEG). Ele me impressionou muito com seu saber e, desde meu primeiro contato com ele, percebi a diferença quando comparado aos outros professores. Assim, decidi que faria pós-graduação, sabendo das dificuldades. Embora não percebesse ainda, Deus estava promovendo minha carreira, colocando diante de mim vários modelos. Portanto, busquei saber as opções para os estudos avançados e tudo apontava para saída ao exterior. Todavia, o plano de Deus para minha vida passou a marcar meu percurso com firmeza, ainda que eu não o sentisse. Meu Pai conhecia o pró-reitor de ensino e pesquisa da UFPA, e numa das suas conversas ele disse ao meu Pai: por que seu filho quer ir para o exterior se há em Manaus, no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) um excelente programa de pós-graduação com docentes internacionais? Naquela ocasião, eu já havia buscado estágio de iniciação científica no MPEG. Meu orientador, um pesquisador bem jovem oriundo dos Estados Unidos, me deu todo suporte e, sem que eu demandasse, ele me chamou e declarou o seguinte: tenho observado seu desempenho e acho que posso lhe oferecer uma bolsa. Aqui está uma passagem para que você vá até o INPA, em Manaus, e fale com o diretor solicitando bolsa. Consequentemente, tomei um voo até Manaus e prontamente fui atendido pelo então diretor do INPA, o qual me concedeu a bolsa com o mesmo valor oferecido a um aluno de mestrado. Assim, percebi que meu orientador estava como que me fazendo assumir um compromisso de ser aprovado na próxima seleção ao mestrado do INPA.

Os meses se passaram, conclui a graduação e o edital para seleção ao mestrado do INPA foi finalmente publicado. Em dezembro de 1977, uma semana antes do natal, foi marcada a aplicação das provas. A referida seleção era aplicada em todo Brasil, assim como em alguns países, incluindo Canadá e Estados Unidos. Na verdade, o diretor do INPA, um cientista destacado no cenário científico, buscava pinçar uma elite cosmopolita de jovens que pudessem alavancar as pesquisas no Amazonas. As provas duravam três dias. Versavam sobre Matemática, Física, Química, Genética, Português, Inglês, além da prova específica da especialidade escolhida. Era como vestibular. No entanto, a data marcada para o início das provas coincidia com o sábado, assim que eu não poderia realizar os exames por minha fidelidade ao princípio da guarda do sábado. Informei ao meu orientador que não faria os exames, causando nele uma tristeza grande, em virtude do seu investimento. No dia da aplicação da primeira etapa não compareci. Fui à igreja para a celebração do sábado, como de costume, esquecendo-me daquele exame. Mal podia perceber que havia um plano em execução. Quando cheguei em casa de volta, o telefone tocou e, ao atende-lo, uma colega que também fizera sua inscrição me perguntou se eu estava ciente do corrido. Disse-lhe que não estava ao que ela me informou que a primeira etapa tinha sido adiada para a próxima segunda-feira, em virtude de um incidente: aos membros da banca que aplicariam os exames, a comunicação oficial do INPA determinava o início para 08:00 horas; para os candidatos, a comunicação dava o início das provas para 09:00 horas. Todavia, o edital assinalava que após 30 minutos do início nenhum candidato poderia ser admitido. Aconteceu que todos os candidatos chegaram além dos 30 minutos estipulados, provocando ausência de todos. Por esse motivo, alteraram a data inicial. Ao receber essa notícia, me dei conta que Deus estava agindo e entendi que Ele havia planejado minha ida para Manaus e para o INPA. Bem, concluídas as provas, logo depois veio o resultado: eu fora aprovado em primeiro lugar.

Embora não tivesse consciência cabal do que estava acontecendo em minha experiencia, meu primeiro ciclo de vida na casa dos meus pais e em Belém estava encerrando; começaria uma nova etapa.

Em fevereiro de 1978 cheguei ao INPA. Tomei um taxi no aeroporto de Manaus e me dirigi ao instituto onde fui recepcionado pelo diretor. Depois fui alojado em um dos apartamentos institucionais, no próprio campus do INPA. Logo em seguida, passei para uma das residências onde morei por dois anos. A comunidade de alunos era composta por brasileiros de muitos estados e estrangeiros sul-americanos, norte-americanos e europeus.

 No início do segundo ano, precisamente em abril de 1979, fui chamado pelo diretor, ocasião em que me ofereceu uma vaga como assistente de pesquisa. Fui tomado de surpresa porque não havia percebido que Deus queria que eu me fixasse em Manaus. Pensei um pouco e decidi aceitar, com a perspectiva de poder sair para outra experiência, caso essa não preenchesse minhas expectativas. Logo passei a ganhar um salário melhor e terminei o meu mestrado já na condição de pesquisador. Imediatamente comecei minhas gestões para o doutorado. Enquanto fazia o mestrado, conheci um pesquisador muito famoso, o qual viera do Smithsonian Institution, o melhor instituto de pesquisas do mundo. Este pesquisador perguntou-me se gostaria de fazer um doutoramento nos Estados Unidos sob sua orientação, assim que comecei a preencher os formulários e logo estava aceito para ir ao Smithsonian. Todavia, um plano superior estava em andamento, conforme dito acima, sem que eu percebesse Deus conduzia meu futuro. E sob essa ordem, os planos mudaram. Aconteceu que, após umas semanas, passava pelo INPA um outro famoso pesquisador brasileiro, docente na Universidade de São Paulo (USP), que assistiu um seminário por mim proferido e, ao final, do nada, ele disse-me que eu deveria me inscrever ao doutorado na USP. Argumentei que já estava aceito para o Smithsonian, mas ele foi enfático e quase obrigou-me a dar-lhe meus documentos para que ele me inscrevesse na USP. Assim, fiz o exame de admissão ao dourado na USP. Dos 14 inscritos passaram apenas 4 sendo eu um deles. Após isso, o professor que me levou à USP disse-me que a vinda para São Paulo somente seria entendida mais tarde. Assim, confiei e realizei minha matrícula. Deus estava dando andamento ao seu plano e o segui sem ter muita noção. Logo percebi que estava num ambiente de altíssima cognição.

A USP é uma universidade onde se respira vanguarda. Em todos os lugares ouvia de assuntos que jamais havia entrado em contato. Aquele ambiente me estimulou a buscar por informações que pudessem fornecer um lastro cognitivo mais denso. Gastei quatro anos com um ritmo acelerado de leitura, não perdendo nenhuma das oportunidades para ouvir grandes nomes da ciência, até mesmo para assuntos que não estavam relacionados diretamente com minha opção de estudo. Era muito diferente da UFPA, muito além do INPA. Neste ambiente fui construindo uma formação mais plural e, desta forma, aprendi a raciocinar com muitas variáveis, coisa muito nova para mim. Terminei meu doutorado com uma base cognitiva bastante diferente daquela que obtivera até o mestrado. Mas, ainda sentia que não estava pronto. Voltei ao INPA e não parei de estudar ciência, sua metodologia, sua lógica. Percebo hoje com clareza meridiana o que aconteceu comigo. Fui exposto a muita luz e, como consequência, não deixei de agradecer ao bom Deus e aos grandes mestres por esse inestimável privilégio. Alguns anos depois fui ao Smithsonian e, ao ver a realidade de brasileiros que faziam seu doutorado lá, pude comparar a minha formação com a deles. Eram bons técnicos, mas não haviam adquirido a experiencia por mim vivida na USP. Como vemos, às vezes o imediatismo pode ser prejudicial. Sempre pensamos que os Estado Unidos são necessariamente melhor opção do que o Brasil.

O que resultou por causa do respaldo cognitivo oferecido pela USP? Vários foram os resultados. Vou apenas citar um deles. Ao regressar ao INPA, fui procurado por pesquisador do Instituto Max Planck, uma das mais importantes instituições científicas da Alemanha. Na ocasião, desenvolviam um projeto em todo cinturão tropical do mundo, buscando verificar quais mecanismos estão envolvidos na manutenção da biodiversidade tropical. Manaus era um dos locais, assim que necessitavam um pesquisador para ser a contrapartida brasileira. Após as assinaturas começaram os trabalhos e uma equipe de pesquisadores alemães e brasileiros passou a visitar Manaus, na etapa de levantamento dos dados. Após quatro anos de trabalhos, o governo alemão galardoou-me com uma visita a Alemanha para assistir, em caráter extraordinário, as avaliações que o ministério da Ciência promove, com um rigoroso exame dos resultados alcançados pelos pesquisadores, os quais são avaliados por uma banca de decanos, uma espécie de prestação de contas ao recurso empregado, verificando se o retorno foi suficiente ou causou prejuízo, e nesse caso, com penalizações. A referida reunião é fechada sendo que eu fui o primeiro estrangeiro a participar, na condição de representante do governo brasileiro. Após as reuniões, fui agraciado com um prêmio que me deu a oportunidade de conhecer instituições de pesquisas em países europeus.

O objetivo deste texto é demonstrar a importância do servir a Deus. Na busca dos meus sonhos não preteri a Deus guardando os princípios celestes. Jamais transgredi o sábado. Deus ainda está no comando do seu plano para a minha vida. Sei que cuidará do meu futuro e, seja qual seja o desfecho, será sempre o melhor. Hoje posso retrover minha vida e reconheço a presença de Deus em todos os caminhos percorridos. Deus tem sido o meu escudo. Durante quase quarenta anos em Manaus, não sofri com nenhuma das doenças tropicais tão comuns na Amazônia. Alcancei nível de respeitabilidade entre meus pares e pude interferir na vida de outros que vieram a mim em busca de auxílio.

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