quarta-feira, 17 de julho de 2024

O Conflito dos Pressupostos: Humanismo e Iluminismo à Luz dos Princípios Bíblicos

 O texto abaixo, é uma continuação de um texto intitulado “O conflito: pressupostos”, o qual é parte do cervo deste blogue. Ali, analisamos o empenho satânico para represar o efeito causado pelo rio de informações nascido na Bíblia. Os movimentos que estão em análise no texto abaixo, são a inundação do vômito que saiu da boca do dragão (Apocalipse 12:15). Facilmente podemos discernir o grande conflito quando comparamos os pressupostos dos referidos movimentos com os propósitos bíblicos.

O humanismo e o iluminismo são dois movimentos intelectuais distintos, mas ambos tiveram um impacto significativo na história e na forma como as pessoas compreendem o mundo. O humanismo surgiu na Itália no século XIV, valorizando a antiguidade clássica e o conhecimento humano. Já o iluminismo foi um movimento cultural europeu dos séculos XVII e XVIII que buscava mudanças políticas, econômicas e sociais. As diferenças e convergências se dão nos seguintes aspectos:

O humanismo Defende o antropocentrismo, ou seja, a ideia de que o homem é a medida de todas as coisas e está no centro da natureza. Promove a educação e a razão como meios para atingir a grandeza humana.

Em razão da valorização do ser humano, o humanismo coloca o anthropos e suas capacidades no cerne do pensamento filosófico e cultural, enfatizando a dignidade e o valor intrínseco de cada pessoa (é evidente que estas ideias estavam no diálogo entre a serpente e Eva: “...serão como Deus...”). Neste caso, a racionalidade é a que leva ao livre arbítrio, este completamente alicerçado na capacidade humana de tomar decisões livres, o que promove a ideia de autodesenvolvimento e autoaperfeiçoamento, tendo como fundamento a valorização do estudo da literatura, filosofia, história e artes como meios para entender a condição humana e desenvolver virtudes. Essas noções são diametralmente opostas às instruções bíblicas. “Guia-me na tua verdade, e ensina-me, pois tu és o Deus da minha salvação; por ti estou esperando todo o dia” (Salmos 25:5); “Mas quem pratica a verdade vem para a luz, a fim de que as suas obras sejam manifestas, porque são feitas em Deus” (João 3:21).

Embora não seja necessariamente antirreligioso o secularismo, separação entre o Estado e as instituições religiosas, próprio do humanismo, tende a enfatizar a importância das realizações humanas fora do contexto religioso.

Por seu turno, o humanismo foca na capacidade humana de atingir grandeza por meio da educação e da razão, enquanto o iluminismo defende a primazia da razão e da ciência para guiar a humanidade.

para o iluminismo, o racionalismo e a Ciência produzirão uma confiança profunda na razão humana e no método científico como ferramentas para compreender e melhorar o mundo, sendo assim assegurado o progresso contínuo da humanidade através do conhecimento, ciência, e inovação social e tecnológica.

Por outro lado, a tecnologia trará a valorização dos direitos e liberdades individuais, incluindo liberdade de expressão, religião e pensamento, bem como a defesa da igualdade perante a lei. Claramente isso pressupõe secularismo e laicidade, promovendo a ideia de que as questões religiosas não devem interferir nos assuntos públicos e políticos. Na verdade, estamos falando de uma crítica às autoridades tradicionais sejam elas políticas, religiosas ou sociais, em favor de uma sociedade mais justa e equitativa baseada na razão (cada ser humano possui impressões éticas e morais inatas) e na justiça originária na experiência humana e não em tradições religiosas. Para tal será necessária a crença de que a educação humanista e secularizada é fundamental para a emancipação do indivíduo e o desenvolvimento de uma sociedade esclarecida e informada.

Ambos os movimentos compartilham uma ênfase na razão e no potencial humano, mas o humanismo tende a focar mais na dignidade e valor individual, enquanto o iluminismo enfatiza o progresso e a aplicação prática da razão para melhorar a sociedade como um todo.

Se pudéssemos fazer uma mescla dos dois movimentos teríamos que o humanismo e o iluminismo, embora distintos em suas origens e ênfases, convergem em sua celebração do potencial humano e na crença no poder da razão. O humanismo, emergindo no Renascimento, coloca o ser humano no centro do universo, destacando a dignidade e o valor intrínseco de cada indivíduo. Este movimento ressuscitou o estudo das humanidades — literatura, filosofia, história e artes — como meios para entender a condição humana e desenvolver virtudes. A racionalidade e o livre-arbítrio são pilares fundamentais, promovendo a ideia de que os seres humanos têm a capacidade e a responsabilidade de se auto aperfeiçoar.

Por sua vez, o iluminismo, florescendo nos séculos XVII e XVIII, também coloca grande ênfase na razão, mas com um foco particular no progresso e na aplicação do método científico para compreender e transformar o mundo. A confiança na ciência e no racionalismo impulsionou inovações que moldaram a modernidade, fomentando uma visão de progresso contínuo. Os iluministas defendiam ardorosamente a liberdade e os direitos individuais, argumentando que a emancipação humana se baseia na liberdade de expressão, pensamento e religião (esta não baseada na Bíblia), bem como na igualdade perante a lei.

Ambos os movimentos compartilham uma valorização do secularismo. O humanismo, embora não necessariamente antirreligioso, defende que as realizações humanas podem ser celebradas independentemente do contexto religioso. O iluminismo, por seu turno, propôs a separação entre Igreja e Estado, sustentando que as questões religiosas não deveriam interferir nos assuntos públicos e políticos, posto que são tradições místicas, variando ao sabor das visões de mundo.

Essa convergência de ideias não apenas protestou as autoridades tradicionais, mas também promoveu uma nova visão de educação e ilustração. Para os humanistas, o estudo das humanidades era essencial para o desenvolvimento pessoal e moral. Já os iluministas viam a educação como a chave para a emancipação do indivíduo e para o avanço de uma sociedade mais esclarecida e justa, com indivíduos acessando livremente ter os mesmos objetos. Quanto mais educação, mais facilidade para acessar objetos, ou seja, a justiça abonará oportunidades iguais para aquisição de bens materiais. É importante lembrar que para o cristianismo, baseado na Bíblia, justiça tem a ver com possibilidades equitativas de crescimento moral em valores e seus significados, uma visão baseada na razão impressa na Torá judaica, sendo que os objetos são apenas pontos de inflexão para apoiar o crescimento em princípios e valores e mudanças de direção.

Assim, a fusão dos princípios humanistas e iluministas molda uma visão de mundo que celebra a capacidade humana de raciocinar, criar e progredir. Essa síntese promove um ideal de sociedade onde a dignidade humana é respeitada, a razão e a ciência são ferramentas essenciais para o progresso, e os direitos e liberdades individuais são fundamentais para a realização de uma vida plena e significativa. Em essência, esses movimentos combinados oferecem uma perspectiva otimista e progressista sobre o potencial humano e o desenvolvimento da civilização.

Ponderando que ambos os movimentos colocam o homem como sendo capaz de encontrar todas as soluções civilizatórias, e que é a razão humana a fonte de toda virtude, encontramos algumas incongruências entre os pressupostos do humanismo e do iluminismo e os propósitos bíblicos, especialmente no que diz respeito à visão sobre o ser humano, a fonte de moralidade e o papel da religião. Aqui estão algumas dessas incongruências:

Humanismo

1. Valorização do Ser Humano:

   - Humanismo: Coloca o ser humano no centro e valoriza a dignidade e o valor intrínseco de cada pessoa.

   - Bíblia: Embora a Bíblia também valorize a dignidade humana (criação à imagem de Deus), coloca Deus no centro de todas as coisas, e a dignidade humana é derivada do relacionamento com Deus.

2. Racionalidade e Livre-Arbítrio:

   - Humanismo: Acredita na capacidade humana de raciocinar e tomar decisões livres.

   -Bíblia: Afirma a importância do livre-arbítrio, mas também enfatiza a necessidade de orientação divina e a limitação da razão humana devido ao pecado.

3. Secularismo:

   - Humanismo: Promove uma visão secular, independente do contexto religioso.

   - Bíblia: Enfatiza a importância da fé e da submissão a Deus em todas as áreas da vida.

 Iluminismo

1. Racionalismo e Ciência:

   - Iluminismo: Confiança profunda na razão humana e no método científico como ferramentas principais para compreender e melhorar o mundo.

   - Bíblia: Reconhece o valor da razão e da observação do mundo natural, mas enfatiza que o verdadeiro entendimento e sabedoria vêm de Deus.

2. Progresso:

   - Iluminismo: Crença no progresso contínuo da humanidade através do conhecimento e inovação.

   - Bíblia: Embora a Bíblia não seja contra o progresso, ela coloca uma ênfase maior na transformação espiritual e na esperança de um futuro redentor através de Cristo.

3. Liberdade e Direitos Individuais:

   - Iluminismo: Valorização dos direitos e liberdades individuais.

   - Bíblia: Reconhece a importância da liberdade, mas ensina que a verdadeira liberdade é encontrada na obediência a Deus e em viver de acordo com Seus mandamentos. Não foca no indivíduo, mas na vida em coletividade e na cooperação com Deus e com os semelhantes, os dois princípios da Torá.

 

4. Secularismo e Laicidade:

   - Iluminismo: Defende a separação entre Igreja e Estado.

   - Bíblia: Embora haja passagens que reconheçam diferentes esferas de autoridade (como "dar a César o que é de César"), a Bíblia geralmente não promove uma separação estrita entre fé e vida pública. No entanto, admite que a mistura estado e religião sempre leva ao uso da força estatal na imposição de dogmas religiosos, um erro bíblico, pois o serviço a Deus é sempre por amor e não pela força.

As principais incongruências surgem do fato de que tanto o humanismo quanto o iluminismo tendem a enfatizar a autonomia e a capacidade humana, muitas vezes de forma independente ou até em oposição à dependência de Deus, central na cosmovisão bíblica. Além disso, o secularismo promovido por esses movimentos pode entrar em conflito com a perspectiva bíblica que contempla Deus como fundamental para o justo implemento de todas as áreas da vida. No entanto, é possível encontrar pontos de convergência em áreas como a valorização da dignidade humana e a busca por conhecimento, desde que estes sejam entendidos dentro de uma estrutura teológica que coloca Deus no centro.

Perspectiva Adventista do Sétimo Dia

Considerando que os movimentos humanista e iluminismo colocam o homem como a solução para seus próprios dilemas, ambos travam uma espécie de duelo com a Bíblia, onde a verdade não está na razão humana e no cientificismo, mas, na obediência aos princípios sagrados, os quais têm sua origem em Deus. Por essa razão, torna-se interessante verificar o que pensam, em particular os adventistas do sétimo dia, uma vez que estes não perfilam com os cristãos tradicionais ou católicos e evangélicos (são classificados de seita). 

Os Adventistas do Sétimo Dia são uma denominação cristã com crenças fundamentadas na interpretação literal e histórica da Bíblia. Algumas ideias do humanismo e do iluminismo podem entrar em contradição com essas crenças. Aqui estão algumas das principais áreas de conflito:

Humanismo

1. Valorização do Ser Humano:

   - Humanismo: Coloca o ser humano no centro e valoriza a dignidade e o valor intrínseco de cada pessoa.

   - Adventistas: Embora também valorizem a dignidade humana (criada à imagem de Deus), acreditam que a centralidade deve ser em Deus e em Seu plano para a humanidade.

2. Racionalidade e Livre-Arbítrio:

   - Humanismo: Enfatiza a capacidade humana de raciocinar e tomar decisões livres.

   - Adventistas: Reconhecem o livre-arbítrio, mas enfatizam a necessidade de orientação divina e a limitação da razão humana devido ao pecado.

3. Secularismo:

   - Humanismo: Promove uma visão secular, independente do contexto religioso.

   - Adventistas: Acreditam que a fé deve influenciar todas as áreas da vida e que Deus deve ser central em todas as decisões. Acreditam que a separação entre religião e estado é salutar à liberdade de consciência, sendo que, as leis deveriam estar baseadas na busca pela justiça, igualdade e proteção dos direitos humanos, refletindo os ensinamentos cristãos de amor ao próximo e compaixão.

 Iluminismo

1. Racionalismo e Ciência:

   - Iluminismo: Confiança profunda na razão humana e no método científico como ferramentas principais para compreender e melhorar o mundo.

   - Adventistas: Valorizam a ciência e a razão, mas acreditam que o verdadeiro entendimento vem de Deus. Eles sustentam que a Bíblia é uma fonte categórica de conhecimento e sabedoria (Jeremias 2:13; Jó 28:28; Provérbios 2:6).

2. Progresso:

   - Iluminismo: Crença no progresso contínuo da humanidade através do conhecimento e inovação.

   - Adventistas: Acreditam no progresso, mas colocam maior ênfase na transformação espiritual e na esperança do retorno de Cristo, que trará a verdadeira renovação (Isaías 55:11; Tessalonicenses 4:1).

3. Liberdade e Direitos Individuais:

   - Iluminismo: Valorização dos direitos e liberdades individuais.

   - Adventistas: Valorizam a liberdade religiosa e os direitos individuais, mas acreditam que a verdadeira liberdade é encontrada em viver de acordo com a vontade de Deus, conforme a lei dos dez mandamentos (Mateus 11:29; Efésios 4:13).

4. Secularismo e Laicidade:

   - Iluminismo: Defende a separação entre Igreja e Estado.

   - Adventistas: Apoiariam a separação em termos de evitar a imposição religiosa pelo Estado, mas acreditam que a fé deve influenciar a vida pública e pessoal.

Pontos de Convergência e Divergência

Convergências:

- Valorização da Educação: Ambos valorizam a educação, mas os adventistas enfatizam a educação que inclui formação espiritual.

- Dignidade Humana: Ambos valorizam a dignidade humana, embora os adventistas vejam essa dignidade como derivada de ser criado à imagem de Deus.

Divergências:

- Fonte da Moralidade: Para os humanistas e iluministas, a moralidade pode ser baseada na razão e no consenso social. Para os adventistas, a moralidade está fundamentada nos ensinamentos bíblicos.

- Centralidade de Deus: O secularismo e a ênfase na autonomia humana dos humanistas e iluministas contrastam com a visão adventista de que Deus deve ser central em todas as áreas da vida.

- Destino Humano: O progresso humano contínuo promovido pelo iluminismo contrasta com a visão adventista de que a solução final para os problemas da humanidade virá com o retorno de Cristo.

Em resumo, enquanto há áreas onde os adventistas podem encontrar pontos de concordância com os princípios do humanismo e do iluminismo, especialmente na valorização da dignidade humana e na educação, há também áreas de significativa divergência, especialmente no que se refere à centralidade de Deus e à fonte da moralidade e do entendimento humano.

Os pontos de concordância não são taxativos, mas algo evasivos, implicando que os movimentos humanista e iluminista têm distanciamentos irreconciliáveis com os adventistas. Isto indica que a fonte dos movimentos tem origem não bíblica. Ambos movimentos têm suas origens na árvore da ciência do bem e do mal.

domingo, 14 de julho de 2024

Justiça, Misericórdia e Humildade na Perspectiva Bíblica: Uma Análise de Miquéias 6:8 e Apocalipse 14

 Nas páginas sagradas do Pentateuco, encontramos o fundamento das virtudes que moldam a fé e a conduta cristã: justiça, misericórdia e humildade. Esses princípios não são meros ideais abstratos, mas mandamentos divinos que norteiam a vida do povo de Deus, formando o alicerce de uma sociedade que busca refletir a santidade e a compaixão do Criador.

Justiça: O Alicerce da Lei Divina

Desde as primeiras palavras do Pentateuco, a justiça se apresenta como um atributo central do caráter de Deus e uma exigência para Seu povo. Em Deuteronômio 16:20, lemos: "Siga a justiça, somente a justiça, para que você viva e tome posse da terra que o Senhor, o seu Deus, lhe dá." Este imperativo revela que a justiça é a base sobre a qual a vida comunitária deve ser construída. A justiça divina é mais que a mera aplicação de normas; é a manifestação da santidade de Deus, que requer uma vida de retidão e equidade.

No entanto, a justiça bíblica não é uma justiça cega e impessoal. Ela é temperada pela misericórdia, como se vê nos repetidos chamados à compaixão e ao cuidado pelos vulneráveis, ecoando a essência do coração divino.

Misericórdia: O Reflexo do Amor de Deus

A misericórdia, em sua forma mais pura, é uma expressão do amor incondicional de Deus por Seu povo. Em Êxodo 34:6-7, Deus se revela a Moisés como "o Senhor, o Senhor Deus compassivo e clemente, paciente, cheio de amor e de fidelidade, que mantém o seu amor a milhares e perdoa a maldade, a rebelião e o pecado." Esta descrição divina enfatiza que a misericórdia não é contrária à justiça, mas uma extensão dela. Deus, em Sua infinita bondade, chama Seu povo a imitar Sua misericórdia, tratando os outros com a mesma compaixão que Ele demonstrou.

A Lei mosaica está repleta de exemplos onde a misericórdia é fundamental. Em Levítico 19:18, o mandamento "Ame o seu próximo como a si mesmo" encapsula o espírito da misericórdia, destacando que o amor ao próximo é um reflexo da justiça e da bondade divinas.

Humildade: A Virtude Essencial

A humildade é a virtude que sustenta tanto a justiça quanto a misericórdia, lembrando-nos constantemente da nossa posição perante Deus. Em Deuteronômio 8:2, Moisés relembra ao povo: "Lembre-se de como o Senhor, o seu Deus, os conduziu por todo o caminho no deserto durante esses quarenta anos, para humilhá-los e pô-los à prova, a fim de conhecer suas intenções, se iriam obedecer aos seus mandamentos ou não." A humildade é a resposta adequada à soberania de Deus, reconhecendo que tudo o que temos e somos provém de Sua graça.

A humildade nos chama a servir aos outros com um coração sincero e despretensioso, a buscar a justiça não para nossa própria glória, mas para a glória de Deus, e a mostrar misericórdia não por obrigação, mas por genuína compaixão.

No âmago da fé cristã bíblica, conforme revelado no Pentateuco, estão as virtudes de justiça, misericórdia e humildade. Essas qualidades, quando integradas na vida do crente, refletem o caráter de Deus e promovem uma sociedade onde a santidade, a compaixão e a reverência ao Criador são fundamentais. A busca pela justiça, temperada pela misericórdia e sustentada pela humildade, não é apenas um chamado divino, mas a essência de uma vida que verdadeiramente honra e glorifica a Deus.

O versículo de Miquéias 6:8 é uma declaração poderosa e concisa sobre o que Deus requer de Seus seguidores. Vamos explorar o significado dessa afirmação. “Ele te declarou, ó homem, o que é bom; e que é o que o Senhor pede de ti, senão que pratiques a justiça, e ames a benignidade, e andes humildemente com o teu Deus?"

Miquéias era um profeta que vivia em um tempo de grande injustiça e corrupção em Israel. Os líderes religiosos e civis muitas vezes falhavam em seguir os mandamentos de Deus, explorando o povo e pervertendo a justiça. Neste contexto, Miquéias 6:8 resume de maneira magistral os requisitos de Deus para uma vida piedosa e justa.

"Pratiques a justiça": Isso significa viver de acordo com os princípios de equidade e retidão estabelecidos por Deus. Praticar a justiça implica tratar todos de maneira justa e imparcial, defender os direitos dos oprimidos e agir de forma honesta e íntegra em todas as áreas da vida.

"Ames a benignidade": A palavra "benignidade" pode ser traduzida como misericórdia, bondade ou amor leal (em hebraico, "hesed"). Amar a benignidade significa cultivar um coração compassivo e amoroso, demonstrando misericórdia e bondade para com os outros. É um chamado para ir além da simples justiça e mostrar um amor ativo e constante, refletindo a misericórdia que Deus demonstra para conosco.

"Andes humildemente com o teu Deus": Andar humildemente com Deus implica reconhecer nossa total dependência Dele, submetendo-nos à Sua vontade e vivendo em obediência aos Seus mandamentos. A humildade diante de Deus nos leva a uma postura de reverência e respeito, reconhecendo que tudo o que somos e temos vem Dele.

Miquéias 6:8 é uma síntese brilhante da ética bíblica. Ela captura a essência do que significa viver uma vida que agrada a Deus: Justiça: Ação correta e imparcialidade em todas as nossas relações. Benignidade/Misericórdia: Um amor ativo e compassivo para com todos. Humildade diante de Deus: Reconhecimento da soberania de Deus e nossa total dependência Dele.

Este versículo nos lembra que a verdadeira adoração e serviço a Deus não são apenas rituais ou sacrifícios externos, mas um compromisso interno e constante com os princípios divinos de justiça, misericórdia e humildade. Deus está mais interessado em como tratamos os outros e em nossa atitude para com Ele do que em meras formalidades religiosas.

Miquéias 6:8 nos chama a viver de maneira que reflita o caráter de Deus em nossas ações, atitudes e relacionamentos. É um convite para praticar a justiça, amar a misericórdia e andar humildemente com Deus, mostrando ao mundo a verdadeira essência da fé cristã. Esta passagem continua a ser uma bússola moral e espiritual para todos os que buscam seguir os caminhos do Senhor.

Encontramos uma ligação entre Miquéias 6:8 e a mensagem angélica de Apocalipse 14, vamos analisar ambos os textos em seus contextos bíblicos e teológicos.

Miquéias 6:8: o parágrafo interrogativo "Ele te declarou, ó homem, o que é bom; e que é o que o Senhor pede de ti, senão que pratiques a justiça, e ames a benignidade, e andes humildemente com o teu Deus?" resume as exigências de Deus para o Seu povo, enfatizando a prática da justiça, o amor à misericórdia e a humildade diante de Deus. É um chamado à vida ética e espiritual que agrada a Deus.

Em Apocalipse 14:6-12 estão as mensagens que admoestam sobre situações de cobrança da parte de Deus.

1.        Primeiro Anjo (Apocalipse 14:6-7): "E vi outro anjo voar pelo meio do céu, e tinha o evangelho eterno, para proclamar aos que habitam sobre a terra, e a toda nação, e tribo, e língua, e povo, dizendo com grande voz: Temei a Deus, e dai-lhe glória; porque vinda é a hora do seu juízo. E adorai aquele que fez o céu, e a terra, e o mar, e as fontes das águas."

2.        Segundo Anjo (Apocalipse 14:8): "E outro anjo seguiu, dizendo: Caiu, caiu Babilônia, aquela grande cidade, que a todas as nações deu a beber do vinho da ira da sua prostituição."

3.        Terceiro Anjo (Apocalipse 14:9-12): "E seguiu-os o terceiro anjo, dizendo com grande voz: Se alguém adorar a besta e a sua imagem, e receber o sinal na sua testa, ou na sua mão, também o mesmo beberá do vinho da ira de Deus, que se deitou, não misturado, no cálice da sua ira; e será atormentado com fogo e enxofre diante dos santos anjos e diante do Cordeiro."

Miquéias 6:8 e o primeiro anjo de Apocalipse 14:6-7 compartilham o tema do temor a Deus. Miquéias nos chama a andar humildemente com Deus, o que implica reverência e temor a Ele. O primeiro anjo clama para que todos temam a Deus e Lhe deem glória, pois a hora do Seu juízo chegou. Ambos os textos destacam a importância de reconhecer a soberania de Deus e viver de acordo com Seus mandamentos, que incluem a prática da justiça.

A mensagem do primeiro anjo sobre a chegada do juízo de Deus está ligada ao chamado de Miquéias para praticar a justiça. O juízo divino é a expressão final da justiça de Deus, onde Ele recompensará os justos e punirá os ímpios. Miquéias 6:8 nos chama a viver justamente, antecipando esse juízo e mostrando misericórdia, refletindo a benignidade de Deus.

O chamado à humildade em Miquéias 6:8 ressoa com o clamor do primeiro anjo para adorar "aquele que fez o céu, e a terra, e o mar, e as fontes das águas." A verdadeira adoração exige humildade, reconhecendo a grandeza de Deus e nossa total dependência Dele. Esta humildade é central para a vida espiritual e ética que Miquéias 6:8 defende.

A mensagem do segundo anjo sobre a queda de Babilônia, símbolo da corrupção e da injustiça, também se relaciona com o chamado de Miquéias para a justiça. A queda de Babilônia é um ato de justiça divina contra a opressão e a iniquidade, ecoando o desejo de Deus por um mundo onde a justiça prevaleça.

A advertência do terceiro anjo contra a adoração da besta e sua imagem e a exortação à fidelidade a Deus refletem a necessidade de viver de acordo com os princípios de Miquéias 6:8. Praticar a justiça, amar a misericórdia e andar humildemente com Deus implica rejeitar a idolatria e permanecer fiel a Deus, mesmo em face da perseguição.

Miquéias 6:8 e a mensagem angélica de Apocalipse 14 estão interligados por um chamado comum à justiça, misericórdia, humildade e adoração verdadeira. Ambos os textos destacam a importância de viver de maneira que haja honra a Deus, reconhecendo Sua soberania e preparando-se para o Seu juízo. Eles exortam os crentes a refletirem o caráter de Deus em suas vidas, permanecendo fiéis a Ele em um mundo muitas vezes marcado pela injustiça e pela idolatria.

segunda-feira, 8 de julho de 2024

A Intersecção entre Neurociência, Teologia Bíblica e Ética: A Influência do Lobo Frontal nas Decisões Morais e os Valores da Torá

A palavra hebraica para "alma" é "נֶפֶשׁ" (nephesh). Na Bíblia Hebraica, "nephesh" Essência da Vida; "Nephesh" é frequentemente traduzida como "alma" ou "vida" e refere-se à força vital que anima o corpo físico. Nephesh é vista como a sede das emoções, desejos e anseios humanos. Além disso, é a personalidade e Identidade; representa a individualidade e a singularidade de uma pessoa.

Na Bíblia "Nephesh" está explicada em vários textos. Em Gênesis 2:7, "E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra, e soprou em suas narinas o fôlego da vida; e o homem tornou-se uma alma vivente (נֶפֶשׁ חַיָּה, nephesh chayyah)" significa uma alma vivente, mostrando que o homem se torna um ser vivo completo com a "nephesh".

Em Levítico 17:11"Porque a vida (נֶפֶשׁ, nephesh) da carne está no sangue", "nephesh" está associada à vida física, indicando que a vida da carne está no sangue.

Em Salmo 42:1"Como o cervo anseia pelas correntes das águas, assim a minha alma (נֶפֶשׁ, nephesh) anseia por ti, ó Deus", "nephesh" é usada para descrever o desejo profundo e a sede espiritual por Deus.

Claramente, a alma humana representa multifaces ou aspectos da existência humana, incluindo a vida, as emoções, os desejos e a individualidade. Na Bíblia, "nephesh" reflete a complexidade da natureza humana e sua conexão profunda com Deus e a vida.

Na disciplina neurociência, o lobo frontal do cérebro é responsável por funções como tomada de decisões, controle de impulsos, planejamento, empatia e julgamento moral. Estas funções podem ser vistas como relacionadas mais diretamente à alma (nephesh), que é a sede das emoções, vontade e personalidade. Portanto, a alma é a dimensão humana mais nobre que está responsabilizada por aspectos que necessitam alta cognição, tais como:

Tomada de Decisões e Controle de Impulsos: Esses processos envolvem a vontade e o autocontrole, que são aspectos da alma.

Empatia e Julgamento Moral: Estas capacidades estão ligadas às emoções e à interação social, também componentes da alma.

Planejamento e Organização: Envolvem a vontade e a racionalidade, características da alma.

Embora a alma (nephesh) na Bíblia seja geralmente relacionado à conexão com Deus e às experiências espirituais, estas estão diretamente ligadas a uma região específica do cérebro como o lobo frontal, sendo vistas mais como uma dimensão transcendental da existência humana. É a nephesh que nos torna diferentes dos demais, e não as posses materiais.

A complexa interação entre o funcionamento do lobo frontal do cérebro humano e os valores éticos contidos na Torá oferece uma perspectiva fascinante sobre como a moralidade é construída e aplicada em nossas vidas. O lobo frontal, sendo a área responsável por funções cognitivas superiores, desempenha um papel crucial na tomada de decisões éticas, controle de impulsos, empatia, planejamento e julgamento moral. Esses processos são fundamentais para a vida em comunidade e para a manutenção de comportamentos que respeitem os valores coletivos e individuais.

A Torá, os cinco primeiros livros do Antigo Testamento, contém um conjunto rico e detalhado de normas e valores éticos que guiam o comportamento dos indivíduos e das comunidades. Esses valores incluem princípios como justiça, compaixão, honestidade, respeito aos pais, proteção aos vulneráveis, e a busca pela paz e harmonia. Vamos explorar como as decisões morais, influenciadas pelo lobo frontal, se alinham com os valores éticos da Torá.

1. Justiça e Equidade (צדק ומשפט - Tzedek u-Mishpat)

   O lobo frontal está envolvido na avaliação das ações e na determinação do que é justo e equitativo. A Torá enfatiza a importância da justiça em várias passagens, como em Deuteronômio 16:20: "Justiça, justiça seguirás, para que vivas e possuas a terra que o Senhor, teu Deus, te dá." A capacidade do lobo frontal de avaliar imparcialmente as situações e tomar decisões justas reflete a busca pela justiça que a Torá prescreve.

2. Empatia e Compaixão (חסד ורחמים - Chesed ve-Rachamim)

   A habilidade de compreender e compartilhar os sentimentos dos outros, governada pelo lobo frontal, é crucial para a prática da compaixão. A Torá exorta os seguidores a amarem o próximo como a si mesmos (Levítico 19:18) e a cuidarem dos pobres, órfãos e viúvas (Êxodo 22:21-22). A empatia facilitada pelo lobo frontal permite que os indivíduos vivam esses mandamentos de compaixão e bondade.

3. Honestidade e Integridade (אמת ויושר - Emet ve-Yosher)

   O julgamento moral e o controle de impulsos, funções do lobo frontal, são essenciais para manter a honestidade. A Torá valoriza a verdade e a integridade, como exemplificado em Levítico 19:11: "Não roubarás, nem mentirás, nem usarás de falsidade com o teu próximo." A capacidade de resistir à tentação de mentir ou enganar é uma demonstração da integridade promovida tanto pelo lobo frontal quanto pela Torá.

4. Responsabilidade e Confiabilidade (אחריות ואמינות - Achrayut ve-Aminut)

   A responsabilidade e a confiabilidade, governadas pelo lobo frontal, são centrais nos mandamentos da Torá sobre cumprimento de promessas e deveres. Em Números 30:2, é dito: "Quando um homem fizer um voto ao Senhor ou fizer um juramento de obrigar-se por algum compromisso, não violará sua palavra; fará conforme tudo o que saiu de sua boca." A capacidade do lobo frontal de planejar e prever consequências é crucial para a manutenção da palavra e das responsabilidades.

5. Respeito e Honra aos Pais (כבוד הורים - Kavod Horim)

   A Torá ordena o respeito e a honra aos pais em Êxodo 20:12: "Honra teu pai e tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra que o Senhor, teu Deus, te dá." O lobo frontal ajuda a moderar o comportamento, permitindo que os indivíduos mostrem respeito e consideração, refletindo a importância desse mandamento.

A interação entre o lobo frontal e os valores éticos da Torá ilustra como nossos processos neurocognitivos sustentam e facilitam a prática da moralidade religiosa. A teologia e a neurociência e juntas podem fornecer uma compreensão mais profunda de como os seres humanos são equipados para viver de acordo com elevados padrões éticos e morais que, na verdade, são o conteúdo da lei dos dez mandamentos. As decisões morais governadas pelo lobo frontal não apenas permitem a convivência harmoniosa na sociedade, mas também capacitam os indivíduos a seguir os valores atemporais contidos na Torá, criando uma sinergia entre biologia (corpo)  e espiritualidade (razão + alma = nephesh).

A proibição bíblica em relação ao uso de bebidas fermentadas tem o respaldo no fato de que o álcool afeta especialmente o lobo frontal do cérebro, que é responsável por várias funções importantes, incluindo a tomada de decisões, o controle de impulsos, a regulação das emoções, o planejamento e a organização. O lobo frontal também desempenha um papel crucial na definição dos valores e significados pessoais, bem como no comportamento social.

Quando uma pessoa consome álcool, ele pode interferir no funcionamento normal do lobo frontal, resultando em:

1. Diminuição do Controle de Impulsos: A pessoa pode se tornar mais impulsiva e propensa a tomar decisões precipitadas.

2. Alteração no Julgamento e na Tomada de Decisões: A capacidade de avaliar situações e tomar decisões sensatas pode ser prejudicada.

3. Mudanças no Comportamento Social: O álcool pode levar a comportamentos sociais inadequados ou arriscados, pois o controle das normas sociais e éticas pode ser reduzido.

4. Regulação Emocional: Pode haver uma dificuldade em regular as emoções, resultando em mudanças de humor ou comportamento agressivo.

5. Valores e Significados: O impacto no lobo frontal pode afetar como a pessoa percebe e valoriza aspectos importantes da sua vida, influenciando suas crenças e atitudes.

Esses efeitos afetam a capacidade cognitiva da alma impedindo a guarda da lei. Por essa razão, a Bíblia adverte contra embriaguez: Provérbios 20:1: "O vinho é zombador e a bebida fermentada provoca brigas; não é sábio deixar-se dominar por eles." Efésios 5:18: "E não vos embriagueis com vinho, no qual há devassidão, mas enchei-vos do Espírito." A embriaguez é associada a comportamentos insensatos e destrutivos. O domínio próprio é uma virtude importante na Bíblia, e a embriaguez compromete a capacidade de tomar decisões sábias e comportar-se de maneira piedosa.

Regras para Líderes Religiosos:

Levítico 10:9: "Nem tu nem teus filhos beberão vinho ou outra bebida fermentada quando entrarem na tenda do encontro, senão morrerão. Este é um decreto perpétuo para as suas gerações."

1 Timóteo 3:2-3: "É necessário, pois, que o bispo seja irrepreensível... não dado ao vinho."

Líderes religiosos são chamados a ser exemplos de comportamento piedoso e a manter a clareza mental e a sobriedade para realizar suas funções espirituais de maneira adequada.

Por outro lado, àqueles que suportam responsabilidades administrativas, a Bíblia admoesta dizendo: 

Provérbios 31:4-5: "Não convém aos reis, ó Lemuel, não convém aos reis beber vinho, nem aos príncipes desejar bebida forte; para que não bebam, e se esqueçam da lei, e pervertam o direito de todos os aflitos." A responsabilidade de governar com justiça e sabedoria requer uma mente clara e discernimento, que podem ser comprometidos pelo consumo de álcool.

Logicamente, a manutenção de almas saudáveis é tarefa para aqueles que estão em preparo para estarem perfilados com os remanescentes, o quarto anjo de Apocalipse 18:1 “ E depois destas coisas vi descer do céu outro anjo, que tinha grande poder, e a terra foi iluminada com a sua glória”.

Se sabemos que a glória significa caráter, o desenvolvimento de nossa nephesh é a obra individual e coletiva para os fiéis. Álcool é uma das variáveis que danificam a alma; temperança em todos os aspectos é a prioridade dos santos.