Nossa mais venerada e
magnificente esperança é, um dia, não muito no futuro, receber o dom da vida
eterna. Aliás, essa é a procura mais persistente em todas as almas humanas. O
homem não foi criado para morrer, assim, a ideia de vida longa é a mais grata e
querida esperança de quem nasceu.
As religiões prometem vida
eterna, quer seja por reencarnações infindáveis, quer por mérito pessoal, ou
através de um salvador. Mas, de qualquer forma, essa noção vem com a humanidade
desde sempre.
A justa causa dessa esperança, no
trivial da concepção humana, é poder vencer tudo que faz cessar a atividade de
uma pessoa, dando-lhe possibilidade de respirar, falar, andar, pensar,
realizar, sem o vislumbre de ter que cessar tudo mais a frente. Todavia, na
Bíblia, a vida não é a possibilidade do movimento perpétuo, e sim a virtude de
poder interagir com os semelhantes enriquecendo a experiencia de outrem. Logo,
vida eterna é a possibilidade ininterrupta de interagir infindavelmente, sempre
buscando melhorar a existência de outros seres. O fundamento desta visão de
vida está no próprio sistema divino da cooperação. Qualquer ente que trave o
referido sistema terá que desimpedir a rede de cooperação, ou seja, sair de
circulação, a morte. Segundo a Bíblia, toda a transgressão e desobediência
recebeu a justa retribuição (Hebreus 2:2), além disso, o salário do pecado é a
morte (Romanos 6:23). Lembrando que pecado é cobiça, fato que contraria o
sistema de cooperação.
Em Mateus 19:16 encontramos um
relato muito elucidativo dessa esperança de vida eterna. “E eis que,
aproximando-se dele um jovem, disse-lhe: Bom Mestre, que bem farei para
conseguir a vida eterna?”. Trata-se de um príncipe que ocupava posições na
hierarquia judaica e tinha grandes haveres. O príncipe havia assistido a
demonstração de amor manifestada por Jesus às crianças e, o coração do príncipe
enchera-se de desejo de ser discípulo do grande Mestre.
O príncipe tinha a si mesmo em
grande conta por supor ser justo e, nessa condição, não pensava que lhe
faltasse nada, considerando-se apto para receber as bençãos. Na verdade, ainda
sentia que havia uma necessidade difusa em sua alma. Jesus lhe informou que
havia a necessidade da guardar os mandamentos, pré requisito para a vida eterna,
ao que o príncipe respondeu que guardava a lei desde a mocidade. Todavia, Jesus
sondou-lhe o caráter ansiando dar-lhe a paz que buscava e disse-lhe: “Se queres
ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro
no céu; e vem, e segue-me”.
Seguir a Cristo significa bem
mais do que estar em uma religião, ainda que seja a verdadeira. É necessário
mudança no sentido de abandonar o que é mundano. Mas, quais coisas são
mundanas? Em Marcos 10:21 está relatado que “Jesus, olhando para ele, o amou e
lhe disse: Falta-te uma coisa”. Cristo apresentou ao príncipe os únicos termos
que poderiam colocá-lo em condições de aperfeiçoar o caráter; aceitá-las e
obedecer era a única esperança de salvação. Sua elevada posição e suas muitas
posses o estavam influenciando para o mal. Se continuasse a acariciar esses
dons, suplantariam a Deus, diminuindo-lhe a força moral, uma vez que posição e
riquezas são sonhos mundanos. Se as coisas desse mundo são nutridas na alma,
tornar-se-ão cruéis feitores. Infelizmente o príncipe, embora apto a discernir
o que Jesus dissera, ficou triste. Preferiu abrir mão da santidade que lhe fora
oferecida pelo próprio Deus. Tivera o privilégio de tornar-se um filho de Deus,
mas, não quis tomar a sua cruz e seguir na vereda da abnegação. Renunciou à
vida eterna.
Em Mateus 25:1-13 há uma
explicação ainda mais didática sobre o que nos falta. Dez virgens esperavam um
noivo com lâmpadas acesas. A demora as fez dormir e, quando o aviso da vinda do
noivo penetrou o silêncio da noite, cinco delas se deram conta de que estavam sem
azeite para acender suas lâmpadas. Sabemos que o azeite é o Espírito Santo.
Mas, como contextualizar o que acontecera?
Em Apocalipse 2:4-5, o anjo da
igreja que está em Éfeso avisa: “tenho, porém, contra ti que deixaste o teu
primeiro amor. Lembra-te, pois, de onde caíste, e arrepende-te, e pratica as
primeiras obras; quando não, brevemente a ti virei, e tirarei do seu lugar o
teu castiçal, se não te arrependeres”. Aqui vemos que há uma advertência
lembrando que Éfeso, a primeira igreja, deveria retrover onde havia caído e
arrepender-se. Então, onde foi que Éfeso caiu?
Éfeso, quanto ao seu
comportamento, está descrita em Atos 2: 42-47: “E perseveravam na doutrina dos
apóstolos, e na comunhão, e no partir do pão, e nas orações. E em toda a alma
havia temor, e muitas maravilhas e sinais se faziam pelos apóstolos. E todos os
que criam estavam juntos, e tinham tudo em comum. E vendiam suas propriedades e
bens, e repartiam com todos, segundo cada um havia de mister. E, perseverando
unânimes todos os dias no templo, e partindo o pão em casa, comiam juntos com
alegria e singeleza de coração, Louvando a Deus, e caindo na graça de todo o
povo. E todos os dias acrescentava o Senhor à igreja aqueles que se haviam de
salvar.
Ora, se o comportamento ou o
caráter dos crentes em Éfeso era a comunhão, no partir do pão e nas orações, ou
seja, havia preocupação com as obras de misericórdia, e se o anjo do capítulo 2
de Apocalipse recomenda que Éfeso deveria retrover seu comportamento para
arrepender-se, de modo que não fosse retirado o castiçal (lâmpada), então, o
que faltou às cinco virgens foram as obras de misericórdia; o resultado da ação
do Espírito Santo. Na primeira carta de João (I João 1:6-7) lemos: “Se
dissermos que temos comunhão com ele, e andarmos em trevas, mentimos, e não
praticamos a verdade. Mas, se andarmos na luz, como ele na luz está, temos
comunhão uns com os outros [...]”. Como pode-se facilmente entender, a falta de
azeite e, consequente extinção da luz é ausência de atos de misericórdia
produzidos pelo conhecimento ou graça de Jesus, ministrada pelo Santo Espírito.
A Entrega do próprio eu é a
essência dos ensinos bíblicos. É por vezes apresentada em linguagem autoritária
porque não há outro modo de salvar os homens senão cortando fora as coisas que,
mantidas, envilecerão todo o ser.
Voltemos à vida eterna. Jesus
conta outra parábola no capítulo 25 de Mateus (Mateus 25:14-30) relatando o
comportamento de três servos que receberam talentos. Dois multiplicaram os
talentos, um, porém, enterrou o único que havia recebido. Há dois conceitos
importantes: multiplicar e enterrar.
O multiplicar está explicado no
livro Parábolas de Jesus (p.190), onde Ellen White afirma que por todo
sacrifício sincero no serviço do Mestre, nossas faculdades aumentarão. O
desenvolvimento de todas as nossas faculdades é a primeira obrigação que
devemos a Deus e a nossos semelhantes. Nunca devemos abaixar a norma de justiça
com o fim de acomodar à prática do mal, tendências herdadas ou cultivadas.
Requer o Senhor de todo cristão crescimento em eficiência e capacidade em todo
ramo. Quanto mais procurar comunicar luz, mais luz receberá. Olhando para
Cristo adquirimos visão mais brilhante e distinta de Deus, e pela contemplação
somos transformados. A benignidade e o amor para com nossos semelhantes
tornam-se um instinto natural. Desenvolvemos caráter que é uma cópia do divino.
Crescendo à Sua semelhança, ampliamos nossa capacidade de conhecer a Deus. Mais
e mais entramos em comunhão com o mundo celeste, e temos poder incessantemente
crescente de receber as riquezas do conhecimento e sabedoria da eternidade.
Pelo acima exposto podemos
definir o enterrar como sendo justamente o oposto do acima; a conformidade com
o mundo. Se a comunhão com os semelhantes é luz, o servo que enterrou o talento
não procurou desenvolvê-lo retirando o talento da rede de cooperação divina,
proibindo outros de serem abençoados. A situação do mau servo é a mesma das
cinco virgens sem óleo, não acumularam tesouros no céu depositando obras de
misericórdia.
Em Tiago 2:8 encontramos o que
segue: “Todavia, se cumprirdes, conforme a Escritura, a lei real: Amarás a teu
próximo como a ti mesmo, bem fazeis”. O verso 13 do mesmo capítulo afirma: “Porque
o juízo será sem misericórdia sobre aquele que não fez misericórdia; e a
misericórdia triunfa do juízo”.
As igrejas cristãs apresentam aos
fiéis um evangelho místico, onde os crentes ajuízam que os ritos são todo
suficientes para assegurar vitória no juízo. No entanto o apóstolo Tiago
adverte: “Porventura o nosso pai Abraão não foi justificado pelas obras, quando
ofereceu sobre o altar o seu filho Isaque? Bem vês que a fé cooperou com as
suas obras, e que pelas obras a fé foi aperfeiçoada. E cumpriu-se a Escritura,
que diz: E creu Abraão em Deus, e foi-lhe isso imputado como justiça, e foi
chamado o amigo de Deus. Vedes então que o homem é justificado pelas obras, e
não somente pela fé. E de igual modo Raabe, a meretriz, não foi também
justificada pelas obras, quando recolheu os emissários, e os despediu por outro
caminho? Porque, assim como o corpo sem o espírito está morto, assim também a
fé sem obras é morta”.
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