terça-feira, 24 de maio de 2016

Nossa Competência para Avaliar e Organizar Fatos


Um dos assuntos mais controvertidos no mundo cristão é o dos dons e ministérios, o qual tem emprego quase equivocado, especialmente entre o chamado mundo evangélico carismático. Não há muita clareza na interpretação dos textos do Novo Testamento que tratam do assunto, pois os teólogos, às vezes, buscam explicações com base em externalidades e não na profundidade dos textos.

A primeira questão que surge ao encarar-se o tema dos dons e ministérios é: por que estes são necessários? A maioria dos grupos religiosos assume uma postura imperiosamente mística quando tenta explicar a razão dos dons e torna quase incompreensível a operação de Deus, uma vez que não lidam com a base da questão. Proponho que vejamos essa dimensão do evangelho através da própria Bíblia.

Em Apocalipse 12:7-10 lemos: “ E houve batalha no céu; Miguel e os seus anjos batalhavam contra o dragão, e batalhavam o dragão e os seus anjos; Mas não prevaleceram, nem mais o seu lugar se achou nos céus. E foi precipitado o grande dragão, a antiga serpente, chamada o Diabo, e Satanás, que engana todo o mundo; ele foi precipitado na terra, e os seus anjos foram lançados com ele. E ouvi uma grande voz no céu, que dizia: Agora é chegada a salvação, e a força, e o reino do nosso Deus, e o poder do seu Cristo; porque já o acusador de nossos irmãos é derrubado, o qual diante do nosso Deus os acusava de dia e de noite”. Tal batalha deu origem ao que a Bíblia denomina de o Grande Conflito; uma controvérsia que abalou o universo criado. Duas idéias estão em debate; dois tipos de governos estão propostos; de um lado está o soberano do universo, Deus todo poderoso, cuja base do governo é a sua lei, com dois grandes princípios: amor a Deus e amor ao próximo. Estes princípios formam um sistema harmônico de ações, onde as criaturas ou inteligências habitando os vários planetas são instadas a cooperar através do desenvolvimento de virtudes individuais que as fortalece moralmente, sendo que os indivíduos passam a operar num alto nível de colaboração e harmonia. Quanto mais elevada é a harmonia, mais forte e consolidado é o Reino de Deus. Neste sentido, o imperativo do Reino é que os súditos sejam moralmente bem constituídos e possam assumir um forte grau de independência do poder central, de tal modo que, cada um pode ser auxílio ao outro, num sistema onde Deus é o grande provedor, mas as criaturas possuem autonomia para administrar umas às outras as necessidades comuns. O Reino de Deus é forte, na razão direta da autonomia dos seus súditos.

De outro lado, a proposta de Lucifer, denominado de a serpente, é diametralmente oposta. Ele propôs um sistema onde a divisão é o motor que impulsiona. Não há cooperação no sentido do crescimento do outro, mas cooperação negativa apenas para que um possa se desenvolver em detrimento de outros, um sistema de concorrência e de predação. A finalidade é fazer com que apenas um líder tenha força e os demais dependam profundamente da liderança. Nesse sistema de governo, o enfraquecimento dos súditos significa o fortalecimento do rei. Assim, dividir representa aumentar o nível de dependência. Tal sistema opera tendo o egoísmo como motor impulsionador. Assim, vemos que o universo outrora harmônico, com o surgimento do grande conflito, tornou-se dividido. Porém, é fundamental verificar que de todos os planetas criados, somente a Terra aderiu ao sistema onde a divisão é a base.

Desde que a serpente foi expulsa do céu, Deus vem trabalhando para restabelecer o sistema da harmonia. Assim, vejamos como têm acontecido as ações divinas sobre a Terra e qual tem sido o resultado.

Adão foi cooptado para o sistema da divisão e, uma vez implantado, tudo ficou afetado por ele. A primeira consequência foi a expulsão de Adão do paraíso. Adão torna-se separado de Deus e perde todas as características que havia recebido de Deus e que o tornara semelhante a Deus. O sistema da divisão operou o primeiro homicídio; quando Deus interpela Cain sobre a segurança do irmão, ele responde que não é o guardador do irmão. Se buscarmos a história, veremos que o sistema da divisão abalou as relações humanas; Jacó e Esaú não cooperam entre si; José e os irmãos se desentendem e, a Bíblia vai apresentando uma sucessão de desarmonias sociais que alçam nossos dias. O sistema de Deus foi substituído, a harmonia deu lugar à divisão.

Considerando que, todos os homens tornaram-se escravos de Satanás, ou seja, estão sob o domínio da divisão, do orgulho e da dissensão, então o céu passou a trabalhar no sentido de devolver a harmonia. No entanto, dado que o homem não possui a harmonia em si mesmo, são necessárias doações de virtudes celestes para que sejam restabelecidas a harmonia e a felicidade. Como podemos enxergar as ações de Deus na história humana para restaurar a harmonia?

Vamos tomar como ponto de partida a construção do tabernáculo no deserto. O livro Patriarcas e Profetas (Ellen White), à página 245 comenta: “Homens escolhidos foram especialmente dotados por Deus de habilidade e sabedoria para a construção do sagrado edifício. O próprio Deus deu a Moisés o plano daquela estrutura, com instruções específicas quanto ao seu tamanho e forma, materiais a serem empregados, e cada peça que fazia parte do aparelhamento que deveria a mesma conter. Os lugares santos, feitos a mão, deveriam ser ‘figura do verdadeiro’, ‘figuras das coisas que estão no Céu’ (Hebreus 9:24, 23) — uma representação em miniatura do templo celestial, onde Cristo, nosso grande Sumo Sacerdote, depois de oferecer Sua vida em sacrifício, ministraria em prol do pecador. Deus expôs perante Moisés, no monte, uma visão do santuário celestial, e mandou-lhe fazer todas as coisas de acordo com o modelo a ele mostrado. Todas estas instruções foram cuidadosamente registradas por Moisés, que as comunicou aos chefes do povo. [...] “E todas as mulheres sábias de coração fiavam com as suas mãos, e traziam o fiado, o azul e a púrpura, o carmesim, e o linho fino. E todas as mulheres, cujo coração as moveu em sabedoria, fiavam os pêlos das cabras. O comentário acima está baseado em Êxodo 31.

A informação acima é de grande importância para a compreensão do raciocínio que virá. Se o tabernáculo deveria ser uma representação da realidade celeste, e se os construtores eram homens submetidos não ao sistema de Deus, mas ao sistema da divisão, então é obvio que a compreensão da realidade superior do céu não poderia ser alcançada por eles. Neste sentido, Deus os dota de sabedoria especial para que pudessem perceber o conceito do sistema divino de cooperação e, consequentemente, tivessem como construir o tabernáculo. O que estamos verificando é que para haver comunicação entre Deus e os homens, é necessário que ferramentas ou virtudes morais sejam confiadas, de modo que haja elevação moral para que homens possam lidar com a realidade celeste.

A essa altura já podemos entender a razão dos dons doados à igreja. Esta é a exibição cósmica da vitória de Deus sobre o espírito de divisão que Satanás introduziu no universo no princípio do grande conflito. O mínimo que os membros do corpo de Cristo – a igreja – podem fazer é parecer unidos e leais aos propósitos eternos de Deus.

Agora, analisemos dois textos importantes para entender os dons e ministérios. O primeiro deles está em I Coríntios 12:1-12: “ Acerca dos dons espirituais, não quero, irmãos, que sejais ignorantes. Vós bem sabeis que éreis gentios, levados aos ídolos mudos, conforme éreis guiados. Portanto, vos quero fazer compreender que ninguém que fala pelo Espírito de Deus diz: Jesus é anátema, e ninguém pode dizer que Jesus é o SENHOR, senão pelo Espírito Santo. Ora, há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo. E há diversidade de ministérios, mas o Senhor é o mesmo. E há diversidade de operações, mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos. Mas a manifestação do Espírito é dada a cada um, para o que for útil. Porque a um pelo Espírito é dada a palavra da sabedoria; e a outro, pelo mesmo Espírito, a palavra da ciência; e a outro, pelo mesmo Espírito, a fé; e a outro, pelo mesmo Espírito, os dons de curar; e a outro a operação de maravilhas; e a outro a profecia; e a outro o dom de discernir os espíritos; e a outro a variedade de línguas; e a outro a interpretação das línguas. Mas um só e o mesmo Espírito opera todas estas coisas, repartindo particularmente a cada um como quer. Porque, assim como o corpo é um, e tem muitos membros, e todos os membros, sendo muitos, são um só corpo, assim é Cristo também”.  

No verso três vemos que homens submetidos ao sistema da divisão, mas que podem ser guiados por Deus podem reconhecer o funcionamento do sistema da harmonia. A estes são enviados sabedoria e conhecimento. Sabedoria aqui é uma palavra que vem do Hebraico, jokmah. Aparece 141 vezes no Antigo Testamento e quase sempre se traduz como "sabedoria". Jokmah abarca uma quantidade de ideias: (1) perícia técnica (Exo. 28: 3; 35: 26; 1 Reis. 7: 14); (2) talento, sagacidade (1 Reis. 2: 6; 3: 28; Job 39: 17; Isa. 10: 13; 29: 14); (3) sabedoria terrenal prática (1 Reis. 4: 30; Isa. 47: 10); (4) sabedoria piedosa (Deut. 4: 6; Sal. 37: 30; 90: 12; Prov. 10: 31; Isa. 33: 6; Jer. 8: 9); (5) sabedoria como um atributo de Deus (Sal. 104: 24; Prov. 3: 19; Jer. 10: 12; 51: 15); (6) sabedoria divina personificada (Prov. 8: 1-36; 9: 1-6); (7) sabedoria humana ideal (Sal. 111: 10; Prov. 1: 2), etc. A "sabedoria" se distingue do "conhecimento" (Hebráico dá'ath), em que "sabedoria" está ligada ao caráter e a conduta, enquanto que "conhecimento" se refere principalmente à cultura intelectual. O conhecimento pede ser só uma acumulação de fatos desconexos, sem a capacidade de aplica-los à vida prática. Por outro lado, a sabedoria é a faculdade que permite aplicar os fatos na vida prática. Neste entendimento ou compreensão está implícita a capacidade de avaliar e organizar fatos, condição essencial para alcançar a sabedoria. A sabedoria, tão encalcada no livro dos Provérbios, é perspicácia prática tal como a que se revela nos ideais morais e no caráter religioso. Os diversos aspectos da sabedoria correspondem com as características do que está à altura das normas de Deus. A sabedoria que descreve Salomão é abarcante no sentido de que cobre todas as fases da vida prática. Não separa a piedade dos deveres comuns da vida. O que tem a verdadeira sabedoria, reflete os requerimentos de Deus em cada pensamento e ato.

O segundo texto está em Efésios 4:8-16: “Por isso diz: Subindo ao alto, levou cativo o cativeiro, E deu dons aos homens. Ora, isto ele subiu que é, senão que também antes tinha descido às partes mais baixas da terra? Aquele que desceu é também o mesmo que subiu acima de todos os céus, para cumprir todas as coisas. E ele mesmo deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores, querendo o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação do corpo de Cristo; até que todos cheguemos à unidade da fé, e ao conhecimento do Filho de Deus, a homem perfeito, à medida da estatura completa de Cristo, para que não sejamos mais meninos inconstantes, levados em roda por todo o vento de doutrina, pelo engano dos homens que com astúcia enganam fraudulosamente. Antes, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo, do qual todo o corpo, bem ajustado, e ligado pelo auxílio de todas as juntas, segundo a justa operação de cada parte, faz o aumento do corpo, para sua edificação em amor”.

Vejamos primeiramente o que está no verso oito, “subindo ao alto, levou cativo o cativeiro”. O texto refere-se a Jesus que subiu ao alto; ora quem sobe já está no alto, então porque subindo ao alto? Porque as coisas altas estão no reino da harmonia onde a lei de Deus é a base das ações, as coisas baixas são aquelas do reino da divisão, daí ter Ele subido ao alto. Mas, diz-nos que levou cativo o cativeiro, ou seja, aquilo que nos oprimia, o sistema ao qual fomos escravizados e encantados, este Ele levou cativo. O texto nos informa que a ascensão de Cristo determinou que qualquer homem que não mais queira estar no domínio da divisão poderá transferir-se para o sistema da harmonia. A continuação verso oito informa que, por causa de ter colocado em cativeiro o sistema do inimigo, pode agora distribuir dons ou virtudes que são necessários aos que estão no reino da harmonia.

Ora, as virtudes são para edificação do corpo de Cristo. Homens que viveram no sistema da divisão devem agora aprender a operar o sistema da harmonia; até que todos cheguemos à unidade da fé, não mais em disputa, mas em cooperação, até que todos alcancem o conhecimento do Filho de Deus, dominem aquilo que somente Jesus sabia, cheguem a homem perfeito, à medida da estatura completa de Cristo, para que não sejamos mais meninos inconstantes, levados em roda por todo o vento de doutrina, pelo engano dos homens que com astúcia enganam fraudulosamente. Perguntamos agora qual é o engano frauduloso dos homens?

Há no mundo cristão aqueles que advogam que a lei dos dez mandamentos foi abolida com a morte de Jesus. Mas esta afirmação não encontra respaldo no texto de Efésios 4, considerando que Jesus levou cativo o sistema da divisão. Os cristãos explicam que agora vivemos no império da graça, onde tudo é permitido porque Jesus cumpriu a lei por nós. Tal raciocínio é estrábico em relação à realidade do texto. Se Jesus subiu ao alto e levou cativo o cativeiro, se todo homem agora é livre para optar entre dois sistemas, se o sistema de Deus é o da harmonia, ou seja, um sistema que pressupõe amor a Deus e amor ao próximo, então a lei não foi abolida. Consequentemente, todo sistema religioso cristão que não advoga a harmonia através da lei é falso ou fraudulento, pois tenta estar no reino de Deus, mas opera pelo sistema da divisão. De fato, especialmente entre os evangélicos, há proliferação de igrejas onde a principal meta é obter vantagens neste mundo. Tal miscelânea é um sincretismo que a Bíblia chama de Babilônia. Assim, os dons são dados aos homens para que estes cresçam e alcancem a estatura de Cristo o qual viveu sem pecado, pois guardou a lei, sendo que pecado é a transgressão da lei (Romanos 2:23).

Agora vejamos como estes dons operam para o crescimento da igreja. Nenhum dom que possamos ter – seja ensino, seja pregação, evangelismo, cura, aconselhamento, visitação, consolação, socorro – deve ser reservado para uso pessoal. Todos eles são designados para o bem coletivo e o crescimento da igreja, caso contrário, os detentores terão seus dons retirados (Mat.25:24-30). O dom da palavra é um talento que deve ser cultivado cuidadosamente. De todos os dons que recebemos de Deus, nenhum é capaz de se tornar maior bênção que este. Com a voz convencemos e persuadimos, com ela elevamos orações e louvores a Deus, e também falamos a outros do amor do Redentor. Que importância tem, pois, que seja bem educada a fim de tornar-se mais eficaz para o bem! A cultura e o correto uso da voz são grandemente negligenciados até por pessoas de inteligência e de atividade cristã. (Parábolas de Jesus, p178). Toda alma está circundada de uma atmosfera própria, que pode estar carregada do poder vivificante da fé, do ânimo, da esperança, e perfumada com a fragrância do amor. Ou pode estar pesada e fria com as nuvens do descontentamento e egoísmo, ou intoxicada com o contato mortal de um pecado acariciado. Pela atmosfera que nos envolve, toda pessoa com quem nos comunicamos é consciente ou inconscientemente afetada. Esta é uma responsabilidade de que não nos podemos livrar. Nossas palavras, nossos atos, nosso traje, nosso procedimento, até a expressão fisionômica tem sua influência. (Parábolas de Jesus, p.180). O dinheiro é de grande valor, porque pode realizar grande bem. Nas mãos dos filhos de Deus é alimento para o faminto, água para o sedento, vestido para o nu. É proteção para o opresso, e meio para socorrer o enfermo. Mas o dinheiro não é de mais valor que a areia, a não ser que o empreguemos para prover as necessidades da vida, para bênção de outros, e para o desenvolvimento da obra de Cristo.  Ninguém suponha que possa viver vida de egoísmo, e então, tendo servido aos próprios interesses, entrar no gozo do Senhor. Não puderam participar da alegria de um amor desinteressado. Não se adaptariam às cortes celestes. Não poderiam apreciar a pura atmosfera de amor que impregna o Céu. As vozes dos anjos e a música de suas harpas não lhes agradariam. Para sua mente a ciência do Céu seria um enigma. (Parábolas de Jesus, p.197).

No evangelho de Marcos 4:30, lemos que Jesus não encontrou na sociedade humana nada com que pudesse comparar o reino de Deus, uma vez que os reinos da Terra se regem pela supremacia do poder físico. “Mas no reino de Cristo não existe arma carnal nem instrumento de coerção. Esse reino deve erguer e enobrecer a humanidade. A igreja de Deus é o recinto de vida santa, plena de variados dons e dotada com o Espírito Santo. Os membros devem encontrar sua felicidade na felicidade daqueles a quem ajudam e abençoam” (Atos dos Apóstolos, p7).

 










quinta-feira, 19 de maio de 2016

A Capacidade de Ser Único


No evangelho de Lucas no capítulo 21:25-27 lemos: “E haverá sinais no sol e na lua e nas estrelas; e na terra angústia das nações, em perplexidade pelo bramido do mar e das ondas. Homens desmaiando de terror, na expectação das coisas que sobrevirão ao mundo; porquanto as virtudes do céu serão abaladas. E então verão vir o Filho do homem numa nuvem, com poder e grande glória”.

Estamos presenciando atualmente grandes sinais na natureza, mudanças climáticas, e na sociedade humana, ondas migratórias dirigidas por grandes incertezas sócio-políticas, grupos armados tirando a paz de milhares, fora a instabilidade social causada pela anomia que assombra as grandes cidades. Literalmente homens desmaiando de terror.

Qual será a origem dessa precariedade? Nosso planeta está submetido às tradições humanas que levam pessoas a serem orientadas para religiões que apenas operam externalidades, não enxergando o âmago do problema: desobediência à Lei de Deus.

O princípio da Lei é o interesse pelo próximo. Harmonia é a palavra que traduz esse princípio. A partir do momento em que o homem desobedeceu a Lei, estabeleceu-se um sistema de divisão e desunião. A Lei está calcada no princípio da unicidade, ou seja, a capacidade de ser único ou formar todos indivisíveis.

A criação foi uma gigantesca demonstração do princípio da unicidade. Litosfera, biosfera e atmosfera existem como unidade. Uma parte não funciona sem a outra e são, por essa característica, unidade singular. O ciclo das águas na superfície da Terra é outro exemplo de unicidade. As águas que evaporam voltam à Terra e formam um conjunto único. Todos os mananciais de águas têm uma origem, os oceanos. De outro lado, ainda que nas condições de pecado, a unicidade pode ser vista: o ciclo da cadeia alimentar, conforme o entendemos, é um forte exemplo, todos os nutrientes que estão presos nas grades estruturais dos seres vivos serão decompostos após a sua morte e tornarão a fazer parte de grade estrutural de outros seres vivos, num ciclo contínuo ininterrupto, até que a Terra chegue ao seu final.

 O fundamento da unicidade está no macro universo, onde as galáxias orbitam em torno de outras galáxias, de modo a manter um fino equilíbrio gravitacional que mantém o cosmo coeso. Do mesmo modo, a estrutura atômica funciona equilibrada tendo os elétrons orbitando o núcleo atômico, equilíbrio mantido pela força eletrostática. Se vamos ao interior da célula, o núcleo celular onde está o DNA, vemos as duas fitas deste formando uma hélice. Tais fitas são formadas por açucares (ribose) onde estão as bases púricas e pirimídicas (Timina, Guanina, Citosina, Adenina, Uracila) que se ligam entre si por pontes de hidrogênio para formar a complexidade do DNA.

Deus foi o criador de tudo e, consequentemente, esse princípio da unicidade é encontrado nEle. São três pessoas formando o que chamamos de Deus: Pai, Filho e Santo Espírito. O Pai não é o Filho e este não é o Espírito Santo, mas os três formam uma unicidade incomum para governar tudo. Estamos falando de uma unidade de três pessoas que formam o Deus infinito e que está além da compreensão humana, mas é conhecido por sua auto revelação (Deut.6:1; Mat.28:19; 2Cor.13:13; etc.).

Na criação do homem vemos o princípio da unicidade transferido. Este é formado por três partes: corpo, alma e espírito. Esta composição é ratificada por Paulo na sua primeira carta aos Tessalonicenses, capítulo 5:23 quando afirma: “E o mesmo Deus de paz vos santifique em tudo; e todo o vosso espírito, e alma, e corpo, sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a vinda de nosso SENHOR Jesus Cristo. Estas três partes devem agir unidas, do contrário causarão infelicidade. Por exemplo, se o espírito trabalha contra o corpo, prejudica a alma. Salomão denuncia isto em Provérbios 1:19 “São assim as veredas de todo aquele que usa de cobiça: ela põe a perder a alma dos que a possuem”. Do mesmo modo, se afetamos ou destruímos o corpo prejudicaremos o funcionamento da alma. Isto está demonstrado em Levíticos 20:25 “Fareis, pois, diferença entre os animais limpos e imundos, e entre as aves imundas e as limpas; e as vossas almas não fareis abomináveis por causa dos animais, ou das aves, ou de tudo o que se arrasta sobre a terra; as quais coisas apartei de vós, para tê-las por imundas”. Assim, percebemos que a inquietação humana é o resultado da quebra da unicidade do homem. No estado de pecador, a não observância da Lei leva ao estado de desequilíbrio das três dimensões, provocando o paradoxo humano; queremos fazer o bem, mas praticamos o mal.

Em Hebreus 4:12 lemos “Porque a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais penetrante do que espada alguma de dois gumes, e penetra até à divisão da alma e do espírito, e das juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração”. Esta afirmação é útil para explicar o que Deus tenta fazer conosco, ou seja, o reequilíbrio do homem. A situação atual é melhor entendida se olharmos o início. “Adão estava diante de Deus na força da perfeita varonilidade, tendo todos os órgãos e faculdades de seu ser plenamente desenvolvidos e harmoniosamente equilibrados. Achava-se ele circundado de coisas belas e conversava diariamente com os santos anjos (Verdade sobre os Anjos, p.49). Em outro trecho do livro O Grande Conflito, à página 83, Ellen White explica: “O homem e a mulher foram formados à imagem de Deus, com individualidade, poder e liberdade de pensar e agir. Conquanto tenham sido criados como seres livres, cada um é uma unidade indivisível de corpo, mente e espírito, e dependente de Deus quanto à vida, respiração e tudo o mais. Quando nossos primeiros pais desobedeceram a Deus, eles negaram sua dependência dEle e caíram de sua elevada posição abaixo de Deus. A imagem de Deus, neles, foi desfigurada, e tornaram-se sujeitos à morte. Seus descendentes partilham dessa natureza caída e de suas conseqüências. Eles nascem com fraquezas e tendências para o mal. Mas Deus, em Cristo, reconciliou consigo o mundo e por meio de Seu Espírito restaura nos mortais penitentes a imagem de seu Criador. (Gênesis 1:26-28; 2:7; Salmos 8:4-8; Atos dos Apóstolos 17:24-28; Gênesis 3; Salmos 51:5; Romanos 5:12-17; 2 Coríntios 5:19, 20; Salmos 51:10; 1 João 4:7, 8, 11, 20; Gênesis 2:15.).

Para restaurar a imagem de Deus na humanidade o céu fez um plano que se desenvolveu desde que nossos pais saíram do Éden. Tal plano foi pensado para aproximar um Deus transcendente a uma humanidade imanente. Assim, a imanência de Deus tornou-se mais sentida no tabernáculo do deserto, quando a presença física de Deus era vista no lugar santíssimo, através do resplendor do Shekhinah. Porém, Deus tornou-se ainda mais imanente quando entregou a Moisés a sua palavra, a Torá, a qual poderia tornar a imanência de dEle cabal pois a palavra estaria na mente do homem. Esta espada de dois gumes que penetra na intimidade do ser agiria para reequilibrar as três dimensões. No entanto, o ato mais crítico e mais importante da imanência de Deus foi a encarnação de Jesus Cristo.  Ele se tornou um com os homens, era o Deus entre os homens e, nesta condição, poderia ensinar pessoalmente a humanidade no caminho do retorno ao equilíbrio ou à imagem de Deus. Se Deus tornara-se um com os homens, os homens poderiam tornar-se um com Deus; estaria de volta a unicidade perdida no Éden.

No entanto, Cristo não permaneceu com a humanidade e voltou para o céu. A pergunta que se levanta é: o princípio da unicidade foi quebrado? Essa questão foi resolvida com a criação da igreja cristã. A Igreja é um corpo com muitos membros, chamados de toda nação, tribo, língua e povo. Em Cristo somos uma nova criação; distinções de raça, cultura e nacionalidade, e diferenças entre altos e baixos, ricos e pobres, homens e mulheres, não devem ser motivo de dissensões entre nós. Todos somos iguais em Cristo, o qual por um só Espírito nos uniu numa comunhão com Ele e uns com os outros; devemos servir e ser servidos sem parcialidade ou restrição. Mediante a revelação de Jesus Cristo nas Escrituras, partilhamos a mesma fé e esperança, e estendemos um só testemunho para todos. Esta unidade encontra sua fonte na unidade do Deus triúno, que nos adotou como Seus filhos. (Romanos 12:4, 5; 1 Coríntios 12:12-14; Mateus 28:19, 20; Salmos 133:1; 2 Coríntios 5:16, 17; Atos dos Apóstolos 17:26, 27; Gálatas 3:27, 29; Colossences 3:10-15; Efésios 4:14-16; 4:1-6; João 17:20-23).

É propósito de Deus que haja unidade entre Seus filhos. [...] A união faz a força; a desunião enfraquece. Unidos uns aos outros, trabalhando juntos, em harmonia, pela salvação dos homens, seremos na verdade “cooperadores de Deus”. 1 Coríntios 3:9. Os que se recusam a trabalhar em boa harmonia desonram grandemente a Deus. O inimigo deleita-se em vê-los trabalhando para fins mutuamente contrários. Essas pessoas precisam cultivar o amor fraternal e a ternura de coração. Se pudessem correr a cortina que lhes vela o futuro e ver o resultado de sua desunião, por certo seriam levados a arrepender-se (Conselhos para Igreja, p.42).