Pesquisador do Inpa contesta reportagem sobre baixa produção científica na região amazônica
Publicado no Jornal GGN ter, 21/05/2013 - 17:33
- Atualizado em 22/05/2013 - 14:02
No dia 13 de maio, o Jornal GGN publicou reportagem da agência de notícias espanhola EFE, Países amazônicos querem romper dependência científica, cujo texto sustentava que a maior parte dos estudos científicos sobre a região era feita por estrangeiros.No artigo que segue, o pesquisador Claudio Ruy Fonseca, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), revela outro lado da história - o de que a maioria dos pesquisadores de fora que estudam a região não a conhece e usa imagens de satélites ou dados coletados e publicados por pesquisadores da Amazônia.
Veja o artigo abaixo:
Claudio Ruy Fonseca
A Amazônia atrai grande quantidade de estudiosos que se debruçam sobre os variados aspectos que envolvem essa complexa região. Cientistas de todas as partes escrevem sobre as características regionais e, no caso de estrangeiros, a maioria nunca veio à Amazônia.
Consequentemente, seus trabalhos estão baseados em dados secundários interpretados a partir de informações de imagens de satélite ou de dados coletados de publicações realizadas por pesquisadores que de fato conhecem a realidade regional, ou seja, a chamada verdade de solo.
Tal situação demonstra que, embora a quantidade de informação publicada por estrangeiros, quando comparada com a informação produzida por autores autóctones, possa parecer superior, a base dessas informações é necessariamente originária das pesquisas realizadas no solo amazônico.
De outro lado, o número de pesquisadores residentes e formalmente inseridos nas instituições amazônicas (pan-amazônia) não ultrapassa os 300 mil, um contingente ínfimo em relação ao restante do mundo. É como dizer que ainda que os pesquisadores publicassem 300 mil trabalhos por ano, não poderiam ultrapassar a quantidade de impressos sobre a Amazônia que tem origem no resto do planeta.
No caso do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), os resultados já publicados são a parte mais importante e substancial das interpretações científicas publicadas por autores estrangeiros. O acervo de informações produzidas no Inpa tem orientado politicas públicas críticas, tais como o Código Florestal. Além disso, a reunião mundial de Ciência e Tecnologia que ocorrerá este ano no Rio de Janeiro teve uma das reuniões preparatórias no Inpa - a esse instituto caberá uma mesa-redonda sobre a Amazônia na referida reunião, o que demonstra a densidade das informações cientificas geradas.
Fizemos um exercício que poderá dar uma ideia sobre nossa capacidade de produzir informações sobre a Amazônia: Utilizando o Google acadêmico, ao se usar a palavra "Amazônia", a busca derivou em aproximadamente 322 mil resultados, refletindo o que já foi publicado pela academia em língua portuguesa. Quando se utilizou a palavra "Amazon", obteve-se aproximadamente 732 mil resultados, representando o dobro de trabalhos acadêmicos em língua estrangeira.
Tais números são autoexplicáveis, considerando que a massa crítica de pesquisadores que publicam em português não pode ser comparada com o restante do mundo. Também é preciso não negligenciar que muitos trabalhos em língua estrangeira, cujos autores são estrangeiros, usam referências de pesquisadores brasileiros. Além disso, por sua vez, muitos pesquisadores brasileiros estão, via de regra, publicando em inglês.
Quando olhamos o número de pesquisadores que estão formalmente locados nas instituições nacionais amazônicas encontramos que dos 8,304 mil pesquisadores apenas 3,877 mil possuem titulação em nível de doutorado, cifras que indicam capacidade regional ainda em construção para produzir informação robusta e em quantidade. Todavia, a região Norte publicou entre 2007 e 2010, 10,8 mil trabalhos em periódicos científicos de circulação nacional, mas, publicou também 9,978 mil trabalhos em periódicos científicos de circulação internacional - acrescente-se ainda 6,626 mil capítulos de livros e 1,152 mil livros completos.
Apenas para completar o raciocínio, se somarmos as quantidades de publicações nos periódicos temos um total de 20,778 mil trabalhos que, se for calculada a média utilizando-se o total de pesquisadores (8,304 mil) dará 2,5 trabalhos por pesquisador em três anos. Se a média for calculada apenas para os doutores (3,877 mil), resultará em 5,3 trabalhos por pesquisador, uma média muito elevada. É dizer que estamos publicando a pleno vapor, mas, nosso esforço jamais suplantará o que o mundo poderá produzir.
*Doutor em Ciências Biológicas (Zoologia) pela Universidade de
São Paulo (1988); Coordenador de Biodiversidade e pesquisador titular
do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa); membro do
conselho curador da Fundação para Desenvolvimento da Biodiversidade;
diretor geral da Associação Brasileira para o uso Sustentável
da Biodiversidade da Amazônia e professor da Universidade do Estado
do Amazonas (UEA).