A questão da cooperação
científica na América do Sul não é assunto de monos-valia e deveria ser uma
pauta tangível dos governos locais. Quando o assunto é Amazônia continental,
vis-à-vis desenvolvimento sustentável, torna-se ainda mais premente a
cooperação e deveria ser imperativa a discussão sobre como os nove países
pretendem estabelecer políticas comuns para garantirem ganhos sem prejuízos ao
patrimônio natural à disposição e nem às relações diplomáticas. Considerando
que a panAmazônia abriga altíssima complexidade, quer seja do ponto de vista da
política, geologia, biologia, etc., além de ser região fulcral às questões
climáticas mundiais, é mister que decisões sobre desenvolvimento amazônico sejam
respaldadas por conhecimento científico. Neste aspecto, o sistema educacional e
a formação de cientistas deveria estar na essência das discussões e ser
encarado como política continental.
A
produção do conhecimento na América do Sul
Há números importantes sobre
produção de conhecimento no contexto da América do Sul que, quando vistos no
conjunto, mostram uma realidade não muito alvissareira. Entre os nove países
amazônicos, o Brasil se destaca como liderança científica ratificada no
relatório 2015 sobre Ciência da UNESCO. O número de pesquisadores doutores nas
instituições brasileiras, em tempo integral, é de longe muito maior (138.653)
do que aqueles nos demais países amazônicos, significando o dobro daquele que está
em segundo lugar; também a quantidade de publicações demonstra a mesma
proporção. Por outro lado, os países sul-americanos não agenciam boa
conectividade e, consequentemente, a cooperação científica é quase inexistente,
fato que adiciona complicadores para políticas comuns. A título de exemplo, as
publicações científicas oriundas dos países amazônicos, têm como os principais
coautores pesquisadores dos USA e Europa ocidental e quando ocorre parceria
sul-americana, esta se posiciona em situação secundária (UNESCO, 2015). Tal
situação pode ser explicada pela preferência estudantil ao buscar formação
superior fora do domicílio. Os estudantes sul-americanos preferem as
universidades nos USA e Europa ocidental em detrimento daquelas que estão na
América do Sul (79.252 estudantes oriundos da PanAmazônia buscaram formação
superior na Europa e nos USA em 2013 (UNESCO (2015))). Assim, logicamente as
parcerias e colaborações vão ocorrer mais com os mestres respectivos e menos
com colegas sul-americanos que podem ser desconhecidos para quem estudou em
universidades americanas e europeias. Todavia, a cooperação científica na
América do Sul e nomeadamente entre os países amazônicos carece de mais intensidade
e amplitude, pois o conhecimento produzido intra América do Sul, se alcançar
níveis de generalizações adequados, será mais adequado porque a verdade de chão
é conhecida aos sul-americanos.
O relatório da Unesco (2015) mostra
também que a distribuição dos pesquisadores sul americanos por setor (negócios;
governo; educação superior) não está escalonada como nos países desenvolvidos.
A grande maioria (60-70%) dos pesquisadores está no ensino superior; uma
percentagem menor (variando entre 8 a 25%) está no setor negócios, significando
que a produção de conhecimento não necessariamente visa empregabilidade no
setor produtivo. No caso brasileiro, as áreas que dominam as publicações
científicas são, em primeiro lugar as ciências médicas, vindo em seguida as
ciências biológicas e, em terceiro lugar estão as publicações em agronomia. Se
as publicações estão voltadas dominantemente para as áreas acima, claramente
não haverá muita informação que esteja pronta para uso industrial, embora às
áreas médica e agronômica dedicam-se muitos esforços em produzir conhecimentos
aplicados.
Ainda no relatório da UNESCO
(2015) ressaltam-se assimetrias em termos de citações, demonstrando a
importância relativa do que é publicado. Em 2015 os artigos brasileiros foram citados
160.383 vezes, de acordo com o indexador Scopus, mas quando esses números são comparados
com os dos USA (1.257.613) fica manifesto que há mais generalização nos
resultados americanos, isto é, as conclusões derivadas das pesquisas americanas
aplicam-se a um amplo conjunto de casos, daí as citações serem tão frequentes. Esses
números também demonstram que a gerência científica brasileira é ainda
incipiente, as instituições não constroem agendas de pesquisas com demandas
claras. São os editais das agências de fomento que direcionam os resultados e
não as instituições. A gerência científica nas instituições não está organizada
de modo a dirigir os projetos para o atendimento dos seus objetivos primários,
e deste modo, os editais gerenciam. Como consequência, os resultados são
fragmentados não permitindo que a sequência concatenada de resultados alcance
níveis de generalidade significativos. Tudo isso deixa à amostra que o
investimento em C, T & I não rende informações consentâneas com a demanda
científico-social para inovações, ou seja, os 2,57% que correspondem à
contribuição brasileira ao conhecimento científico mundial representam pouco
quanto à aplicabilidade.
Conhecimento
transformado em economia
O raciocínio acima parece
respaldado pelos números correspondentes às patentes. A América do Norte
submeteu, em 2013, ao United States Patent and Trademark Office (USPTO) 145.741
patentes, correspondendo a 52% do total mundial, enquanto que a América Latina
submeteu 829 no mesmo período, correspondendo a 0,3% do total mundial, e ao
Brasil correspondeu 341 submissões, perfazendo 0,1% do total mundial. Os 2,57%
das publicações científicas mundiais procedentes do Brasil resultaram em 0,1% das
patentes mundiais, ou seja, os 59.479 artigos publicados em 2013 resultaram em
341 patentes. Pode-se ver que o investimento em ciência está retornando de
forma inexpressiva em termos de inovações e economia.
No contexto acima, quando
olhamos às regiões brasileiras, o Norte não representa motivo para
investimentos em inovações, considerando que os dados do Instituto Nacional da
Propriedade Industrial-INPI demonstram incipiência na solicitação de patentes
(FIG.1).
FIGURA 1 - Patentes concedidas
no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), por residentes, por
grandes regiões, 2000-2012 (Fonte: CNPq)
Esta situação parece estar conexa
com o número de doutores no Brasil por grandes áreas de conhecimentos de acordo
com a plataforma Lattes do CNPq. Por exemplo, segundo as estatísticas
apresentadas pelo CNPq, há 34.136 doutores nas Ciências Humanas, mas somente
18.700 nas Engenharias. Para Amazônia há apenas 375 doutores em engenharia. Com este cenário muito claramente entende-se a
razão da baixa solicitação de patentes.
A academia da região norte do
Brasil não é agressiva no sentido de buscar maior representatividade na
distribuição dos investimentos e não parece estar interessada em articular-se
com as esferas de comando do estado brasileiro. A bancada política amazônica,
em todos os níveis, parece não ter compreensão do quanto se poderia melhorar
econômica e socialmente a Amazônia se conhecimento científico voltado à
inovação pudesse ser gerado pelas Instituições de Ciência e Tecnologia-ICT
regionais. O diálogo entre governo regional e academia ocorre, mas não reproduz
os anseios do setor produtivo, uma vez que a academia quer colonizar a
sociedade através de conhecimento eticamente neutro, ou seja, as pesquisas
realizadas não respondem perguntas originadas nos gargalos tecnológicos das
indústrias ou até mesmo voltadas às demandas sociais críticas, ou ainda respondem
de forma tangencial às demandas paradigmáticas exigidas pela própria ciência. Essa
situação tem como raiz a ausência de treinamento acadêmico para operar transdisciplinarmente,
além da preocupação muito difusa com o retorno social do investimento público.
As agências nacionais de fomento
para C, T &I atuam num ciclo vicioso que se mantém contra a região
amazônica, o qual se nutre da lógica nefanda do baixo investimento por causa da
pequena densidade de pesquisadores (6.098 doutores e 5.820 mestres, sendo que
mestres não lideram financiamentos). No entanto, o número de pesquisadores nas
instituições da região norte brasileira é, por exemplo, maior que os
pesquisadores no sistema de C&T do Equador (2.735) e da Bolívia (1.646) e
próximo do número de pesquisadores na Colômbia (7.702) (UNESCO Institute for
Statistic, 2015). A título de esclarecimento, a quantidade de bolsas produtividade
outorgadas pelo CNPq para os Estados do Amazonas e Pará corresponde a 1.898
bolsas, enquanto que para o Estado de São Paulo são liberadas 41.598 bolsas. É
claro que não estamos advogando cotas para a região norte, mas a assimetria
mostrada é perversa, considerando que o território amazônico brasileiro
corresponde a 60% da pan-Amazônia e 45% do território brasileiro. Tal situação
está a requerer ação estruturante para a pesquisa amazônica; treinamento aos
pesquisadores para a construção de projetos que possam ser avaliados par e par
com os demais projetos brasileiros. As FAP’s regionais deveriam considerar o
financiamento de treinamentos para conferir maior agressividade ao sistema de
C&T local. A formação de grupos de pesquisas interinstitucionais e
programas regionais de pesquisas poderiam melhorar a atração de fomento.
A
transição para economia verde
O grande diferencial entre a
Amazônia e as demais regiões do mundo é a riqueza vegetal, animal e de
microrganismos, além da riqueza mineral, todas ainda quase intocadas, mas que se
devidamente conquistadas poderão ser o motor à transição da fronteira
agropecuária à fronteira do capital natural, conforme Becker
(2011).
Considerando a assimetria
entre a região norte e as regiões brasileiras de maior densidade cognitiva; considerando
que a Amazônia tornou-se um apreciável centro de interesses da ciência e
tecnologia; considerando que a Amazônia é fator imprescindível na sustentação
do planeta, sendo, por consequência, uma questão global; considerando que o
desafio amazônico é uma questão de estado; considerando que o número de
universitários amazônicos estudando fora é maior do que o número dos de fora
estudando na Amazônia; considerando que o potencial amazônico para novos
materiais, segurança alimentar, biotecnologia, engenharia da madeira,
engenharia naval e principalmente economia verde está muita aquém das
expectativas, sugere-se um debate aprofundado para definir políticas à
construção de um ambiente robusto em ciência e tecnologia na Amazônia continental.
A necessidade de se superar um
ambiente onde políticas públicas são construídas à margem da C, T & I,
exige que sejam criados arranjos institucionais inovadores, redesenhando as
composições em escalas locais, regionais, nacionais e internacionais. Há
necessidade de pensar, conforme Becker (2011), uma C, T & I aberta aos
horizontes das novas múltiplas territorialidades, conectividades e conexões
locais-globais. Está-se falando de uma CT&I que se constrói e constitui em
proximidade e vínculo com as inovações sociais em curso no contexto amazônico; tarefa
estratégica para um novo planejamento territorial que se apoie sobre uma ampla
aliança entre universidades, instituições de pesquisa e empresas, visando
fortalecer vínculos comunicativos de mútuo aprendizado entre o lócus acadêmico
regionalizado de reflexão, conhecimento, crítica e formação de competências e o
lócus da inovação, difusão e empreendedorismo. Estamos falando da consolidação
da base científica para utilização do potencial natural e socioeconômico
regional de forma sustentável; promoção de sinergia explícita e dinâmica entre
as instituições, de forma a compartilhar projetos e recursos humanos para o
incremento da inovação e para agregar valor à biodiversidade, atendendo às
demandas sociais crescentes.
As universidades,
especificamente, e não apenas faculdades, são entes determinantes de
crescimento socioeconômico. Sua influência modeladora transforma espaços e idealiza
comportamentos. Nos espaços onde há presença de universidades sempre ocorre o
fortalecimento da classe média, e por essa razão há progresso social. Em
qualquer situação política onde há interesse desenvolvimentista, nada ocorrerá,
nenhuma alteração positiva social haverá na ausência de universidades voltadas
às demandas sociais. Assim, no ambiente amazônico, universidades são
imprescindíveis.
No caso do Estado do Amazonas,
ocorre absoluta concentração das universidades públicas e privadas em Manaus e,
por essa razão, a concentração dos doutores (1.462) ocorre na capital. Logo,
qualquer política visando desenvolvimento social deverá promover adensamento
educacional no interior, descentralizando a academia.
Em setembro de 2000, os
presidentes dos países sul americanos resolveram criar uma iniciativa para
integrar o continente no tocante à infraestrutura (IIRSA). Objetivavam
modernizar, desenvolver a infraestrutura para transporte, energia e
telecomunicações. Foi colocado um prazo de 10 anos para a efetivação. Foram
criados eixos de integração, sendo um deles denominado eixo do Amazonas,
compreendendo as calhas dos rios Solimões e Amazonas, os principais redutos
demográficos, mas incluindo as áreas amazônicas peruana, colombiana e
equatoriana. Todavia, nada aconteceu. Particularmente na calha do rio Solimões,
há concentrações populacionais na região de Tefé e Coari, bem como há
concentrações na zona da fronteira oeste, ou seja, Tabatinga, Benjamin Constant.
As áreas referidas poderiam albergar duas universidades estaduais voltadas às
demandas locais. Além disso, na calha do rio Amazonas, na região de Itacoatiara
e Parintins há outro polo demográfico suficiente para implantar outra
universidade estadual. Assim, o Estado do Amazonas poderia manter, além da
capital, três outras universidades estaduais com programas específicos de
ensino e pesquisas voltados às demandas de cada microrregião, buscando a
produção de conhecimentos e tecnologias apropriados ao seu desenvolvimento. Se
tais universidades se consolidassem como centros importantes de estudos em
biologia tropical, mineração e transporte, entre outros, haveria atração de
massa crítica capaz de materializar o tão sonhado desenvolvimento sustentável,
além de desenvolver uma classe média adequada para criar riqueza fora da cidade
estado que é Manaus.
A criação de universidades
estaduais robustas poderia ser vista como parte de uma estratégia para
concretizar um programa específico para o desenvolvimento da Amazônia
continental. Tal estratégia é fundamental, considerando que a posição da
Amazônia brasileira é mais vulnerável do que a dos outros países, uma vez que,
do ponto de vista do relevo, Colômbia, Peru, Bolívia e Equador possuem áreas
amazônicas pré andinas, ou seja, estão altimetricamente mais elevadas, em
consequência disso, qualquer mudança nas condições ambientais e/ou ecológicas
nesses países afetaria dramaticamente a Amazônia brasileira. Assim,
universidades regionais poderiam funcionar como fornecedoras de conhecimento
científico suficiente para orientar politicas continentais de desenvolvimento.
A
cooperação continental e a necessidade de lideranças
Políticas continentais exigem
cooperações multilaterais. Estas ocasionam o incremento de expertise, melhor
adequação de custos e investimentos, desembocando no compartilhamento de
habilidades e aptidões, conhecimentos, ideias, equipamentos e resultados de
pesquisa. Há na América do Sul pesquisas e tecnologias compatíveis com os
padrões internacionais. Essa base facilita o debate sobre, por exemplo,
mudanças globais, sustentabilidade energética e segurança alimentar e de saúde.
Posto que o mundo globalizou a pesquisa, a criação de um programa de mobilidade
sul-americano poderia ser parte da agenda político-científica continental, um
facilitador para cooperação. Melhor seria se pudesse ser criada uma rede de
universidades sul americanas que adviesse mobilidade aos cientistas, de modo a
fazer surgir ambiente de cognição elevado. Tal iniciativa poderia ser
capitaneada pela Organização do Tratado de Cooperação Amazônica - OTCA, como
uma das consequências das discussões sobre o Observatório Amazônico,
considerando que já existe a infraestrutura do Mercosul com alianças já
firmadas no âmbito educacional, fato que fortaleceria a integração científica
regional. A criação de um conselho Sul Americano de Universidades com missão
específica para desenvolver estratégias comuns para educação superior, bem como
a promoção de redes de centros de excelência através do continente provocaria a
construção de um ambiente científico regional que poderia mudar a economia.
Se a infraestrutura em
transporte, energia e telecomunicações é o objetivo estabelecido para a América
do Sul pela IIRSA, então, será necessária a criação de um ambiente para que as engenharias
fossem pujantes nas universidades, aliás, uma lacuna que necessita ser
resolvida, já que o censo da educação superior de 2015 aponta números de cursos
de engenharia muito aquém das demandas amazônicas. Em toda Amazônia há apenas
um curso de engenharia naval; 8 cursos de engenharia elétrica; 3 cursos de
engenharia de telecomunicações; 1 curso de engenharia de pesca. Esses números
indicam que dificilmente se logrará infraestrutura adequada, o que consente
perceber que a velocidade de apropriação da riqueza amazônica nunca atingirá o
patamar necessário ao desenvolvimento sustentável. É necessário lembrar que
está em andamento a União das Nações Sul Americanas (UNASUR), com sede em
Quito, Equador, que traz como um dos seus objetivos a integração científica.
Os grandes gargalos regionais
poderão ser resolvidos com o readequamento das universidades para lecionarem
conhecimentos voltados à realidade regional com a produção de ciência
compatível com a das universidades de pesquisa e com capacidade para dialogar
com a setor produtivo. Ainda mais fundamental e emergente é a urgente elevação
dos níveis educacionais relativos ao ensino fundamental e médio. Estes níveis
educacionais têm índices muito abaixo da expectativa nacional e internacional.
Mesmo que as universidades amazônicas se tornem centros catalisadores
importantes, alunos malformados nos níveis iniciais de ensino não poderão
aproveita-las.
A produção de ciência e
inovação causará a criação de Núcleos de Inovações e Tecnologias (NIT) com alta
fluência em proteção intelectual e transferência tecnológica.
A argúcia em perceber um
ambiente como acima transformaria as cidades em núcleos de agregação de valor
aos produtos regionais, além de sedes de atividades de pesquisa e
desenvolvimento articuladas entre si. Na verdade, o que temos hoje é uma
equação malfazeja. Por exemplo, a população estimada em 2016 para a calha do
rio Solimões é de 443.697 habitantes. A população dessa região matriculada no
ensino fundamental é de 24.341 (5,4%) habitantes. Aquela matriculada no ensino
médio é de 15.260 (3,4%). Portanto, apenas 8,9% dos habitantes da calha do rio
Solimões estão no sistema educacional, significando que para aqueles brasileiros,
a aquisição de riqueza não necessariamente passa pela educação. Assim, tem-se
um trabalho de conscientização sobre a importância da educação para a
modificação da situação socioeconômica.
Se for realizado um algebrismo
semelhante ao anterior na esfera da academia veremos a lacuna existente no tocante
à liderança. Vejamos, os bolsistas de produtividade no Brasil (docentes que se
destacam na produção do conhecimento científico) somam 120.268. A região norte
possui 2.082 bolsistas produtividade os quais correspondem a 1,7% do total
brasileiro. Há na região norte 6.899 docentes doutores, destes apenas 30% são
detentores de bolsas produtividade. Os números advertem baixa liderança
regional.
Com um pouco de esforço, seria
possível reverter este quadro, pois há pontos fortes que não são triviais no
sistema de C&T amazônico. Há um conjunto relevante de Instituições
Científica e tecnológias (ICT), Instituições de Ensino Superior (IES) e
Institutos de Tecnologia que possuem importância regional, nacional e
internacional. Algumas IES apresentam boa capilaridade regional, mas há IES
privadas também, além de ICTs privadas que podem ser demandadas para atender a
diversidade temática regional. Há avanço na estruturação de parques tecnológicos
e incubadoras tecnológicas. Também tem sido intensa a presença das Fundações de
Ampara à Pesquisas (FAPs) regionais as quais, juntamente com as Secretarias de
Ciência e Tecnologia estaduais, têm alavancado o fomento à produção científica.
Tal ambiente favorece a
criação de redes de centros de pesquisas visando a excelência, a organização
científica, de forma a ciar o trinômio Estado, Academia e Setor Privado, acrescendo
coerência às atividades de pesquisas e relacionamento dos vários atores
científicos regionais. Muitos problemas de pesquisa básica e aplicada
necessitam de massa crítica, de financiamento, além da combinação e
complementariedade da expertise em vários domínios. Portanto, mapear os grupos
de excelência em pesquisas com intuito de formação de redes pode significar
avanço, dadas as condições amazônicas. Redes poderiam ser motivação para buscar
níveis mais altos de desempenho, mudando a realidade cognitiva e física com a
junção de intelectos e equipamentos.
A promoção da excelência em
pesquisa fará emergir resultados que poderão ser apropriados pela indústria, e
nesta esteira se poderá aumentar a capacidade econômica e de mercado com a
geração de novos produtos, tornando a Amazônia competitiva e atrativa para
novas empresas. Porém, faz-se necessário
perenizar os financiamentos e incrementar e fidelizar os recursos humanos. Há
necessidade de adicionar ao financiamento estatal o recurso do setor privado.
Considerando a condição sul
americana quanto aos recursos para C&T, torna-se imperioso o esforço
coletivo à criação de facilidades bilaterais ou multilaterais para organizar
programas transnacionais de suporte continental à infraestrutura de pesquisa. A
ideia é a criação de laboratórios para uso da comunidade científica sul americana.
O compartilhamento de infraestrutura diminuirá gastos com equipamentos e
manutenção, além de maximizar a utilização dos equipamentos. Laboratórios de
uso compartilhado facilitarão a substituição de equipamentos que ficam
obsoletos com rapidez, como é o caso de equipamentos para química, modificando
a forma de fomento atual que investe em equipamentos individuais, os quais, na
maioria dos casos, não são utilizados em sua capacidade plena, o que força a
diminuição da vida útil dos equipamentos e pulveriza recursos financeiros. Por
outro lado, hoje há na Amazônia laboratórios com investimentos na ordem de
milhares de Dólares, cujos pesquisadores lideres já estão em vias de
aposentadoria. Por causa da não contratação de novos pesquisadores, os
laboratórios referidos poderão fechar a curto prazo, provocando descontinuidade
e perda de investimentos. A pergunta que deve ser colocada é: qual será o
futuro da infraestrutura já pronta? Entendemos que a montagem de estruturas
laboratoriais de uso compartilhado poderia resolver a questão, pois poderá
absorver equipamentos nas condições acima, mas exigirá novo arcabouço legal
internacional.
Uma das deficiências na
América do Sul é a disponibilidade de bancos de dados quer para pesquisas quer
para administrar C&T. A comunicabilidade continental está aquém do
potencial atual das telecomunicações, um problema crítico que perturba a
interação regional. O Brasil detém infraestrutura de comunicações muito
superior aos demais países sul americanos e, nesta condição, faz uso de bancos
de dados que não estão disponíveis ao continente. Um exemplo é o Portal de
Periódicos CAPES, uma ferramenta de pesquisa bibliográfica muito avançada que,
se disponibilizada, poderia facilitar o trabalho em coautorias no continente.
Porém, há necessidade de bancos de dados para fauna, flora e microrganismos,
até mesmo banco de dados para moléculas. Também não há periódicos científicos
internacionais com fatores de impacto significativos, que discutam problemas e
possibilitem a divulgação de resultados compatíveis com as expectativas mundiais.
No caso da Amazônia
continental, é urgente a formulação de programas de pesquisa coordenados de
modo a evitar a fragmentação de esforços e de fomentos. Tais programas poderiam
garantir a reciprocidade de informações sobre objetivos e condições de
elegibilidade e participação que poderia incluir países vizinhos.
Aumentar a cooperação entre as
FAPs e agências de fomento regionais para olharem os problemas comuns
(financiamento, integração de pesquisadores, diálogo com outras regiões e
países), buscando a formação de uma rede que possa discutir o papel das FAPs no
contexto de C&T regional e suas relações recíprocas. A prioridade deverá
ser o estabelecimento de condições para consulta política entre as FAPs, visando
à construção de imagem de coerência da C&T regional. Além disso,
poder-se-ia pensar em sistema de referência técnica e científica para
implementação de políticas, ou seja, desenvolvimento de pesquisas para embasar
decisões em face de problemas e situações emergenciais, bem como harmonização
de procedimentos, métodos e comparação de resultados.
Um ambiente de compartilhamento
pressupõe um programa científico comum consentido e mobilidade para treinar
pesquisadores e técnicos visando o desenvolvimento harmônico do continente. A
ciência é um formidável drive para segurança e para o desenvolvimento
sustentável.
REFERÊNCIAS
Becker, B. K. (2011).
Inovações Institucionais para Viabilizar Ciência, Tecnologia e Inovação como
Vetores de Transformação do Caminho Amazônico de Desenvolvimento. Nota
técnica. Laboratório de Gestão do Território. Departamento de Geografia
da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). 61pp
Centro de Gestão e Estudos
Estratégicos. Plano de Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento da
Amazônia Legal. Brasília, DF: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos,
2013.
UNESCO 2015. UNESCO Science Report: towards 2030. Paris. 743 pp