ASSINALANDO OS UMBRAIS COM SANGUE
O plano da salvação tem sido intuído
pela humanidade, às vezes, de forma equivocada. Concebido para operar nas
condições de uma humanidade caída, o plano deve ser olhado do ponto de vista do
tempo. Esta perspectiva parece clara quando olhamos os dois macros momentos do
plano lado a lado com a maneira como a Bíblia foi organizada: Antigo e Novo
testamentos. Apenas a título de esclarecimento, a palavra testamento significa o ato pelo qual a pessoa declara a sua vontade; assim, temos na Bíblia
a antiga vontade de Deus, assim como a nova vontade de Deus. Por causa destes
conceitos, deveríamos ler a Bíblia, ou seja, a vontade de Deus a partir destas
perspectivas, buscando saber a vontade de Deus no decorrer do tempo.
Na perspectiva do
Antigo Testamento, o culto tinha seu principal argumento no sacrifício de
animais. Por essa razão, o santuário hebraico oferecia ininterruptamente
sacrifícios que apontavam à vinda futura do Messias e Salvador. Na perspectiva
do Novo testamento, o argumento do culto centra-se na Santa Ceia, onde o
sacrifício de animais é substituído pelo símbolo do pão e do vinho. Chamamos atenção para os dois momentos do plano da redenção: o primeiro (Velho Testamento)
antes de Cristo, e o segundo (Novo Testamento) depois de Cristo. A pergunta que
surge agora é: Por que foi necessária a mudança de argumentos, ou seja, o que
estaria Jesus ensinando quando substituiu a Páscoa pela Ceia?
Vamos recapitular
a Páscoa, para entendermos o que aconteceu. A primeira Páscoa ocorreu na saída
do povo Hebreu do Egito. Deus ordenara através de Moisés que na noite que
antecedeu a saída, os hebreus matassem um cordeio sem defeitos, assassem a animal
inteiro sem quebrar nenhum osso, adicionassem ervas amargas e pão sem levedura,
e o comessem de pé prontos para a partida. Além disso, deveriam passar o sangue
do animal morto nos umbrais das portas das casas para que o anjo destruidor não
matasse os primogênitos hebreus (última das dez pragas no Egito). A palavra
hebraica para páscoa é Pessach que significa passar sobre. Ellen White, no seu
livro Patriarcas e Profetas, na página 274 explica o seguinte: “Antes da
execução desta sentença, o Senhor por meio de Moisés deu instruções aos filhos
de Israel relativas à partida do Egito, e especialmente para a sua preservação
no juízo por vir. Cada família, sozinha ou ligada com outras, deveria matar um
cordeiro ou cabrito "sem mácula", e com um molho de hissopo espargir
seu sangue ‘em ambas as ombreiras, e na verga da porta’ da casa, para que o
anjo destruidor, vindo à meia-noite, não entrasse naquela habitação”. Neste
trecho da sua narração Ellen White esclarece que o ato de aspergir o sangue
protegeu os hebreus do juízo que veio sobre o Egito, ou seja, da morte. Ela
prossegue dizendo: “O Senhor declarou: Passarei pela terra do Egito esta noite,
e ferirei todo o primogênito na terra do Egito, desde os homens até aos
animais; e sobre todos os deuses do Egito farei juízos. ... E aquele sangue vos
será por sinal nas casas em que estiverdes; vendo Eu sangue, passarei por cima
de vós, e não haverá entre vós praga de mortandade, quando Eu ferir a terra do
Egito". Novamente surge uma pergunta: Por que o sangue era necessário para
proteger os hebreus?
A resposta a esta
questão está no Éden. Deus havia sentenciado que se o homem pecasse certamente
morreria. Logo após a que do homem, Deus poupou a vida do casal original substituindo
a morte deles pela morte de um cordeiro. Ali fora oferecido o primeiro
sacrifício animal que apontava para o verdadeiro cordeiro de Deus, o Messias,
que viria oportunamente no futuro. Assim, Adão e sua mulher foram poupados da
morte imediata. O sangue do cordeiro imolado no Éden fez com que a destruição
passasse por sobre o casal. A mesma situação ocorreu no Egito naquela noite
quando Deus aplicou juízo sobre o arrogante país. O sangue aspergido nas portas
representava a Cristo, a verdadeira páscoa. Vejamos o que diz novamente a
escritora Ellen White na página 227 do livro Patriarcas e Profetas: “A
páscoa devia ser tanto comemorativa como típica, apontando não somente para o
livramento do Egito, mas, no futuro, para o maior livramento que Cristo
cumpriria libertando Seu povo do cativeiro do pecado. O cordeiro sacrifical
representa o ‘Cordeiro de Deus’, em quem se acha nossa única esperança de
salvação. Diz o apóstolo: "Cristo, nossa páscoa, foi sacrificado por
nós." I Cor. 5:7. Não bastava que o cordeiro pascal fosse morto, seu
sangue devia ser aspergido nas ombreiras; assim os méritos do sangue de Cristo
devem ser aplicados à alma. Devemos crer que Ele morreu não somente
pelo mundo, mas que morreu por nós individualmente. Devemos tomar para o nosso
proveito a virtude do sacrifício expiatório”.
Pelo que vimos acima, a Páscoa é
um evento de altíssima seriedade e que não deveria ser negligenciada.
Deveríamos destacar algum tempo buscando a compreensão desta cerimônia,
considerando que a sua aplicação ou uso nos livra da morte. Outra vez, vejamos
o que diz Ellen White: “As regras que Moisés deu concernentes à Páscoa são
plenas de significado, e têm aplicação a pais e filhos nesta época em que
vivemos [. ...] . O pai devia atuar como sacerdote da família e, se o pai fosse
falecido, o filho mais velho devia realizar o solene ato de aspergir os umbrais
da porta com o sangue. Esse é um símbolo da obra a ser feita em toda família.
Devem os pais reunir os filhos no lar e apresentar Cristo diante deles como sua
Páscoa. O pai deve dedicar cada membro da família a Deus e fazer a obra que é
representada pela festa da Páscoa. É perigoso deixar esse solene encargo nas
mãos de outros. Decidam os pais cristãos que serão leais a Deus, e disponham-se
a reunir os filhos no lar consigo e assinalem [simbolicamente] os umbrais com
sangue, representando Cristo como o único que pode proteger e salvar, a fim de
que o anjo destruidor passe por alto o feliz círculo da família” (Fundamentos do
Lar Cristão, p. 129).
Abrimos aqui um parêntese para
explicar algo importante para a compreensão do que virá a seguir. Depois de
haver ocorrido o pecado no universo, Jesus se tornou a pessoa da trindade
responsável para resolver o problema do pecado e, por esse motivo, tornou-se o
interlocutor para o homem. Assim, fora Jesus quem instruíra Moisés quanto ao
ritual da Páscoa, sendo que Ele mesmo participou da solenidade enquanto esteve
entre os homens. Se a Páscoa é assim de extrema importância e instituída por
Jesus, por que ele a substituiu pela Ceia? Jesus teria proibido a Páscoa?
Vejamos o que nos diz a própria
Bíblia sobre essa questão. Em I Cor. 11:23-26 lemos: “O Senhor Jesus, na noite
em que foi traído, tomou o pão; e, tendo dado graças, o partiu e disse: Tomai,
comei; isto é o Meu corpo que é partido por vós; fazei isto em memória de Mim.
Semelhantemente também, depois de cear, tomou o cálice, dizendo: Este
cálice é o Novo Testamento no Meu sangue; fazei isto todas as vezes que
beberdes, em memória de Mim. Porque todas as vezes que comerdes este pão e
beberdes este cálice anunciais a morte do Senhor, até que venha" . No
livro Desejado de Todas as Nações (pag.652, 653) Ellen White diz que “Cristo se
achava no ponto de transição entre dois sistemas e suas duas grandes festas.
Ele, o imaculado Cordeiro de Deus, estava para se apresentar como oferta pelo pecado,
e queria assim levar a termo o sistema de símbolos e cerimônias que por quatro
mil anos apontara à Sua morte. Ao comer a páscoa com Seus discípulos, instituiu
em seu lugar o serviço que havia de comemorar Seu grande sacrifício. Passaria
para sempre a festa nacional dos judeus. O serviço que Cristo estabeleceu devia
ser observado por seus seguidores em todas as terras e por todos os séculos. A
páscoa fora instituída para comemorar a libertação de Israel da servidão
egípcia. Deus ordenara que, de ano em ano, quando os filhos perguntassem a
significação desta ordenança, a história desse acontecimento fosse repetida.
Assim o maravilhoso livramento se conservaria vivo na memória de todos. A
ordenança da ceia do Senhor foi dada para comemorar a grande libertação
operada em resultado da morte de Cristo.
Até que Ele venha a segunda vez em poder e glória, há de ser celebrada esta
ordenança. É o meio pelo qual Sua grande obra em nosso favor deve ser
conservada viva em nossa memória”.
A Santa Ceia representa o mesmo
que os sacrifícios de animais representaram no Antigo Testamento. Para a época antes
de Cristo, o sangue de animais apontava para o Messias vindouro e pela fé, os
antigos se apoderavam da salvação. Na Ceia os símbolos são, do mesmo modo, uma
poderosa demonstração de fé. Assim como os antigos hebreus comeram a carne do
cordeiro morto, ao comermos o pão (símbolo do corpo) comemos o cordeiro. Do
mesmo modo, aos antigos passarem o sangue de um cordeiro nos umbrais das suas
portas, significando que criam no sacrifício expiatório e substituto de Cristo
no futuro, sendo libertos da morte, hoje, ao tomarmos o vinho (símbolo do
sangue), estamos passando o sangue nos umbrais das nossas almas, ou nos umbrais
das nossas casas que são nossos corpos e, deste modo somos também libertos da
morte. Conforme vimos, a ceia passa a ser a páscoa, pois Jesus, o Messias
prometido, veio e cumpriu a promessa feita a Adão sendo nosso substituto e, portanto,
a nossa páscoa. Cristãos sem a Ceia correm sério perigo de vida, jamais deveríamos
negligenciar a participação na Ceia porque não sabemos quando passará o anjo
destruidor.
Mas, ainda resta algo de grande importância
que não abordamos e que está relacionado com a Ceia. Vejamos mais uma afirmação
de Ellen White no livro Desejado de Todas as Nações (pág. 659): “Participando
com os discípulos do pão e do vinho, Cristo Se empenhou para com eles, como seu
Redentor. Confiou-lhes o novo concerto, pelo qual todos os que o recebem se
tornam filhos de Deus, e co-herdeiros de Cristo. Por esse concerto pertencia-lhes
toda bênção que o Céu podia conceder para esta vida e a futura. Esse ato de
concerto devia ser ratificado com o sangue de Cristo. E a ministração do
sacramento havia de conservar diante dos discípulos o infinito sacrifício feito
por cada um deles individualmente, como parte do grande todo da caída
humanidade”. O texto enfatiza que a Santa Ceia é o ritual que confere ao
cristão o status de filho de Deus, e co-herdeiros de Cristo. Então, não
participar da Ceia significa desistir da salvação. Porém, Ellen White afirma
também que através da Ceia, toda benção que o céu pode conceder será concedida.
É uma promessa valiosa que precisa ser entendida. Em Isaias 58:14 lemos “[...]
e te sustentarei com a herança de teu pai Jacó; porque a boca do SENHOR o disse”.
Este verso é a resposta que precisamos para entender a promessa concedida
através da Ceia. Porém, qual é a herança de Jacó? Jacó era filho de Isaac, o
qual, por sua vez era filho de Abraão. Assim, a herança de Jacó veio de Abraão
seu avô e podemos encontra-la em Genesis 12:2,3 onde lemos: “E far-te-ei uma
grande nação, e abençoar-te-ei e engrandecerei o teu nome; e tu serás uma
bênção. E abençoarei os que te abençoarem, e amaldiçoarei os que te
amaldiçoarem; e em ti serão benditas todas as famílias da terra”.
A benção dada a Abraão é que ele
seria uma bênção e, por consequência, todas as famílias seriam benditas. Jacó recebeu esta
mesma benção quando lutou com Deus no vale de Jaboque. Tal benção está à nossa
disposição através da Ceia. Ser uma benção significa viver completamente de
acordo com Lei de Deus. Em João 13:35 lemos: “Nisto todos conhecerão que sois
meus discípulos, se vos amardes uns aos outros”. O raciocínio dos textos acima
nos mostra que através da Ceia somos habilitados a guardar os mandamentos e
consequentemente seremos uma benção ao mundo. Para abençoar nosso semelhante é
necessário que tenhamos para oferecer, assim, receberemos dos céus todas as
virtudes necessárias para que sejamos uma benção.
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